Crítica: Starfield é complexo, mas muitas vezes raso

Por Jean Kei

Nota: 7

Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge

Starfield é um caso um pouco complicado. O mais novo jogo da Bethesda Game Studios e o primeiro exclusivo para Xbox desde sua aquisição veio com muitas expectativas sobre dele. Várias pessoas criaram expectativas em cima de coisas não tão bem explicadas ou tendo impressões de que o jogo seria similar a algo como No Man’s Sky, o que ele não é. Também houveram expectativas de que ele seria um Fallout ou Elder Scrolls no espaço, considerando o histórico de jogos da Bethesda. O que em partes ele até pode ser, mas vir necessariamente com essa expectativa pode levar a frustração. E claro, houve pessoas que, por amor ou ranço a marcas de videogame, decidiram qual a opinião do jogo antes mesmo de lançar e nada do que ele fizesse ou deixasse de fazer mudaria o veredito delas.

Eu, pessoalmente, estava pendendo um pouco a achar que seria uma espécie de Fallout ou Skyrim, mas sabendo que era uma IP nova depois de tanto tempo, estava aberto a ver algo totalmente diferente.

Antes de qualquer coisa, qual a premissa do jogo?

Em Starfield, você joga com um personagem que estava trabalhando como minerador e acaba tendo contato com um artefato que pode revelar grandes segredos do universo. A forma com que o artefato reage a você chama a atenção de um grupo conhecido como Constelação, que prontamente lhe chama para participar do grupo e ir atrás de mais desses artefatos, para possivelmente descobrir coisas novas neste universo onde diversos planetas e sistemas já foram colonizados e o planeta Terra já não é mais habitável.

Grupo esse que deixa bem claro que te deixa livre para agir como achar melhor. Assim, você poderá explorar o jogo da forma que achar melhor. Quer ser assassino, ladrão, trambiqueiro? Seja! Quer ser um bem feitor que faz tudo com empatia? Pode ser também!

Os membros de sua equipe podem reagir a como você joga, mas a organização da Constelação sempre te aceitará.

Durante o jogo você encontra muitas histórias sobre os planetas colonizados, as organizações que as ocupam e todos os conflitos envolvidos. Temos grandes facções que você pode participar, cada uma com sua própria história e conflitos, e tendo apresentações bem diferentes

Quais as facções do jogo?

Temos a empresa Ryuijin, que fica numa cidade bem cyberpunk, e suas missões são muito sobre espionagem e intrigas corporativas.

Você pode participar da Vanguard, que é uma organização militar voluntária das Colônias Unidas que surpreendentemente tem missões bem legais que as vezes envolve um clima mais de terror, as vezes é bem mais ação e a historia deles conversa bem com isso.

Também temos os Freestar Rangers, que são patrulheiros que estão descobrindo e tentando impedir um esquema que quer tomar pequenas fazendas pelos planetas.

E também podemos nos juntar aos piratas da Frota Escarlate, piratas espaciais que pilham e matam por dinheiro, e você pode entrar para a organização por motivos diferentes e isso pode afetar sua lealdade (ou falta dela) com o grupo.

Starfield tem uma construção de mundo bem grande e que me agradou num geral, mas sua forma de abordá-lo é um pouco diferente dos jogos anteriores da Bethesda.

E de fato, Starfield é bem diferente de seus outros jogos em vários aspectos

A primeira coisa que me chamou atenção é em como Starfield leva seus elementos RPG de forma diferente. Aqui trabalhamos menos com distribuição de atributos e mais diretamente com a arvore de habilidades. Isso, na prática, deixa seu personagem mais flexível ao longo do jogo.

Normalmente em RPGs, eu escolho minhas habilidades com base no que priorizei nos atributos por questões de otimização. Em Starfield, porém, minhas habilidades são escolhidas pelo contexto da forma com que estou jogando. O jogo reforça sua construção de personagem baseado em como você joga na maneira que ele limita sua arvore de habilidades, deixando você colocar pontos para melhorar uma habilidade apenas se realizar certas conquistas.

Quer colocar mais pontos em persuasão? vai ter que resolver pelo menos dez situações na lábia! 

Mas a diferença crucial de Starfield com Elder Scrolls e Fallout é na sua dinâmica de exploração.

Nos dois jogos citados, temos um grande mundo aberto onde você vai olhar para pontos de interesse e descobrir coisas novas no caminho, já em Starfield, temos vários pequenos mapas em cada planeta onde os principais são muito densos, mas a maioria são mapas procedurais com pouco a se fazer.

E…infelizmente Starfield também é menos intuitivo que seus outros jogos

Starfield é um jogo complicado de início, ele tem muitas peculiaridades em como se explorar suas mecânicas e não explica nada de forma intuitiva.

Demorou um bocado para entender como fazer entrepostos (bases para gerar recursos) de forma eficiente e como tirar vantagem disso. Outra coisa que demorou mais do que devia era em como fazer uma nave que coubesse mais tripulantes e mais passageiros (descobrir que há essa diferenciação demorou também).

Minhas primeiras cinco horas (de sessenta) foram jogando meio perdido, sentindo que estava fazendo algo errado e tendo muita dificuldade em batalhas com a nave. Mas depois que entendi como entrepostos funcionam, como otimizar minha nave e realizar certas missões especificas, o jogo fluiu muito bem. O processo de descoberta das mecânicas de Starfield foi prazeroso, mas também percebi o quanto, na realidade, ele é raso

E é na pouca profundidade em que ele se assemelha a outros jogos mais recentes da Bethesda

Esse jogo é sim um RPG, mas ele é bem mais um jogo de ação do que eu gostaria. São poucas situações aonde eu realmente vi que poderia tomar diversas abordagens diferentes, a maioria esmagadora das situações vão ser resolvidas na troca de tiros.

E sim, temos bugs.

Dos jogos que joguei do estúdio, esse foi o com menos bugs. Claro, temos bugs aqui, alguns poucos que afetaram negativamente minha jogatina. Houve um bug em que num diálogo várias vozes falavam de uma vez e o texto pulava e já teve um ponto de missão que só ativou quando reiniciei o jogo.

Tirando isso, a maioria dos bugs que peguei eram coisas inusitadas e engraçadas, desde personagens estando aonde não deveriam até minha nave passar a andar de lado ou ficar invisível.

Mas o maior pecado dos jogos da Bethesda é sua escrita rasa

Claro, você terá missões variadas e entrará em algumas situações inusitadas no jogo, algumas bem criativas. O jogo brinca com a moralidade ambígua do mundo em diversos momentos, mas a sua escrita um tanto truncada faz isso ficar raso.

Tal qual a escrita dos jogos recentes da Bethesda, aqui nada parece muito natural ou vivo. O jogo apresenta conceitos muito interessantes, toda a premissa do jogo principal se tratar de curiosidade cientifica, certas missões de facção que apresentam ambientações interessantes me empolgam, mas na hora de aprofundar em qualquer um de seus temas ou até mesmo olhar de forma menos grandiosa e trabalhar os personagens, sinto que o jogo peca muito.

A forma com que os personagens conversam com você é mecânica demais, a forma com que o jogo tem claramente uma programação de quando certos diálogos ativam e elas aparecem em momentos inapropriados quebra minha imersão. No fim, eu tive muito interesse inicial nas pessoas que cercavam meu personagem, mas só os enxergava como bonecos e não me importava de verdade com nenhum deles. Aqui temos um mundo interessante, cheio de boas premissas, mas que ta tão preocupado em falar e abraçar tanta coisa que acaba não sendo nada.

Tudo isso culminou comigo terminando o jogo na mais completa apatia. 

Principalmente depois de uma missão profundamente mal escrita, com diálogos contraditórios a cada cinco minutos e com uma moralidade cinza forçadíssima, o pouco que me importava com as pessoas do mundo do jogo se esvaiu. Acabou que para mim o universo do jogo era só um playground, e não um mundo com personagens envolventes.

Mas… estranhamente o jogo abordou esse meu sentimento com o final e o New Game+.

Pensando sobre Starfield, eu cheguei na conclusão que ele quer ser muitas coisas mas acaba não falando sobre nada na verdade. Ele fala sobre o glamour da curiosidade cientifica e o quanto o universo é vasto, encantador mas pode ser muito amedrontador, mas não aborda nada disso com profundidade.

Eu não vou elaborar sobre as revelações, sobre o final ou o new game+ do jogo, mas saiba que ele faz coisas bem interessantes que conversaram bastante com minha apatia com o universo do jogo.

Eu acho que acabou sendo acidental, mas me peguei pensando o quanto o texto sobre a resolução final do jogo conversa sobre a apatia do jogador com o que ele está vendo a sua volta, e como ele enxerga as coisas apenas como um objetivo a ser conquistado, não importando as relações supostamente construídas ao longo do caminho.

Observei muitos comentários afirmando que a melhor forma de aproveitar esse jogo, é focando em terminar o jogo e depois parti para as coisas secundárias… Por favor, não caia nessa

Starfield tem um New Game+ com coisas interessantes que provavelmente o peso delas só acontece se você conhece bem o mundo do jogo. Pela natureza do final, é possível que quem chegue no New Game+ fique, na realidade, desestimulado de explorar as opções secundárias do jogo.

Enfim, Starfield terminou sendo um bom jogo e me deu o que pensar, mas ele tem muitas coisas não aproveitadas e poderia ser menos raso.

Nome do jogo:

Starfield

Publisher:

Bethesda Softworks

Desenvolvedora:

Bethesda Game Studios

Plataformas Disponíveis:

PC, Xbox Series S|X