Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge
Like a Dragon Infinite Wealth é o nono jogo principal da franquia que antes era conhecida como Yakuza. O título mais recente conta com dois protagonistas, Kasuga Ichiban, o protagonista do jogo anterior (Yakuza: Like a Dragon) e Kazuma Kiryu, protagonista da série do 0 ao 6.
Confesso tinha um pé atrás com Infinite Wealth. A história do Kiryu supostamente havia se encerrado no Yakuza 6, e voltar com ele me parecia uma decisão puramente comercial e covarde.
Felizmente eu estava errado e Infinite Wealth é um jogo além de corajoso, um dos melhores títulos da franquia.
Like a Dragon Infinite Wealth, tal qual o jogo anterior, é um RPG por turnos com mecânicas que abraçam em partes suas raízes de um jogo Brawler. Aqui temos uma versão mais polida do que vimos em Yakuza Like a Dragon. Mesmo tendo um combate por turnos, a animação dos golpes ainda remete aos jogos mais antigos da série, e o posicionamento do seu personagem e inimigos, junto ao timing, importam.
Na prática, isso significa que mesmo que o jogo seja por turnos, ele tem um certo dinamismo único. Num RPG por turno qualquer a animação de ataque do boneco é puramente estética, aqui não. Caso você dê um golpe especial que envolva um chute alto num inimigo caído no chão, o golpe vai errar, por exemplo.
Além disso, se você empurra um inimigo pra frente de um aliado, ele poderá encaixar um segundo golpe. O jogo também leva o cenário em contexto, fazendo com que carros causem dano e que objetos do cenário possam ser usados como armas.
Fazer ping-pong do inimigo e ver ações em conjuntas dando certo é mágico, e as vezes até imprevisível. Nenhum inimigo vai te atacar durante seu turno, mas eles se movem, fazendo com que timing seja importante para otimizar seus golpes.
Infinite Wealth tem tantos minigames, substories variadas, momentos do extremo da comédia pastelão misturados com um drama pesado, que arrisco dizer que mesmo quem não gosta de jogos por turnos pode sair satisfeito daqui.
A coisa mais incrível deste jogo é o quanto ele é imersivo e está sempre te entregando coisas novas. É inacreditável o quanto esse jogo tem de variedade sem parecer desconexo e mantendo o jogo num bom ritmo.
Além de atividades clássicas como Karaokê, Mahjong, dardos e os jogos do Fliperama (em breve falo deles), temos um minigame de delivery parodiando Crazy Taxi, um que envolve tirar foto de homens sarados de tanguinha que lembra um tanto Pokemon Snap e dois minigames profundos, grandes que envolvem mecânicas muito diferenciadas do jogo principal.
O primeiro minigame principal são as Batalhas Sujimon. Uma clara paródia de Pokémon aonde você usa Sujimon (como chamam os inimigos do jogo) para lutarem entre si.
Seu objetivo é se tornar um Mestre Sujimon ganhando batalhas, desafiando a Elite de 4 e eventualmente o Rei Sujimon. Cada Sujimon tem elementos diferentes que possuem vantagem, o sistema de combate dos Sujimon é totalmente diferente do combate principal e lembra Pokémon GO. Todo o texto da subtrama dos Sujimon é um humor pastelão fino que me fez rir mais do que devia.
Como se não bastasse, ao obter sua primeira Insígnia no jogo, você ganha uma ocupação chamada Sujimante , aonde Ichiban pode invocar Sujimon nas lutas do jogo principal. Fortalecer os seus monstrinhos acaba sendo um investimento que recompensa no jogo base de formas diretas, tanto por ganhar dinheiro quanto fortalecer habilidades.
Focar na história das batalhas Sujimons vai te custar tempo, tempo o suficiente de jogar um jogo inteiro de uma escala menor.
Depois de quase quarenta horas de jogo (fazendo muitas sidequests e brincando em muitos minigames) chego em outro minigame robusto e extenso, a Ilha Dondonko.
A Ilha Dondonko é um Resort que já foi um dos melhores da região, porém, piratas atacaram o local e o transformaram em seu lixão pessoal.
Com a ilha toda suja e poluída, pessoas pararam de ir e o Resort entrou em falência. Ichiban acaba encontrando Gachapin e Mukko, os mascotes da ilha que o levam para lá. Ichiban então resolve enfrentar os piratas, limpar a ilha e faze-la voltar a ser o Resort dos sonhos que ela foi originalmente… O que resulta num jogo similar a Animal Crossing que pode durar entre oito à dezenas de horas.
Aqui o jogo ganha uma estrutura de jogo de ação super simples. Você usa o lixo, pedras e madeira da ilha para criar itens de forma recicláveis no Resort.
E esses itens são desde mobílias pequenos a grandes prédios. Seu objetivo principal é fazer uma ilha bonita, com itens populares e que satisfaçam visitantes do Resort e limpar o lixão de lá… E de vez em quando enfrentar piratas do lixão, numa gameplay simples de combate em tempo real de ação.
Em dado momento, você habilita uma fazenda e pode fazer seus Sujimon trabalharem nela para ganhar mais recursos, e quanto mais amigo dos Sujimon, maiores resultados no trabalho. Também é possível fazer um lual com os hóspedes do Resort, que gera um momento engraçadinho e gostoso.
A Ilha Dondonko é um jogo com texto divertido, mecânicas simples mas gostosinhas e que vai habilitando cada vez mais funções para otimizar sua administração no local, e é uma ótima forma de ganhar muito dinheiro no jogo.
Sabe os mascotes que citei? Então, eles são protagonistas de um programa de TV infantil japonês de muito sucesso da década de 90, que de vez em quando é referenciado em coisas de cultura pop japonesa.
O jogo tem muitos textos citando curiosidades sobre a Sega, temos os minigames que parodiam outros jogos e o fliperama tem ports surpreendentemente bons.
Eu sou muito fã de ter Spike Out, um Beat’n Up 3D que fez sucesso dentro de um nicho e hoje é um jogo bem desconhecido disponível para você jogar num fliperama de Infinite Wealth.
Virtua Fighter 3tb também está disponível, esse foi um jogo que foi meio divisivo pela forma com que trata seus cenários no balanceamento do jogo e implementa a modalidade de Team Battle, mas acabou sendo chamado por muitos de datado devido a época que lançou, principalmente seu port de Dreamcast é uma coisa que adoro.
São jogos que quando você dá uma olhada, carregam histórias interessantes, e vê-los completamente disponíveis para jogar é louvável.
Ao terminar o jogo, fiquei com sentimentos um pouco mistos com a história principal. Enquanto ela tem temas maravilhosos, momentos genuinamente emocionantes e o jogo todo tem uma coesão temática tanto nas substories quanto o que ele quer dizer no jogo principal, acho que principalmente no final ele se perde e fica inconsistente. Contudo, não consigo falar que desgostei da história do jogo.
Logo depois do jogo anterior, Ichiban passou a trabalhar na Hello Work para ajudar ex-Yakuzas a se reintegrarem na sociedade dando emprego para eles.
O jogo passa horas mostrando o dia a dia de Ichiban e seu grupo de amigos, tem toda uma cena longa dele indo para um encontro e o jogo mostra um plot slow burn muito gostoso. O jogo não tem medo de gastar tempo para mostrar a fundo cotidiano e cenas casuais com seus personagens, o que no fim das contas, faz você se apegar bastante ao grupo.
Infelizmente tudo da errado quando armam para Ichiban e lançam uma Fake News acusando-o de coagir ex-Yakuzas para o mundo do crime. Isso custa o emprego do protagonista e estranhamente o Clã Seiryu está recrutando muitos ex-Yakuzas para a família. Ichiban e seu grupo decidem investigar, coisas acontecem, e descobre que sua mãe biológica está viva e está no Havaí e ele viaja para encontrá-la.
Ao chegar no Havaí, Ichiban se envolve com conspirações sinistras, gangues da cidade e encontra Kazuma Kiryu, o segundo protagonista do jogo, que estava fazendo um trabalho no país.
Eu tinha muitos pés atrás com o retorno de Kiryu. A franquia afirmou que a história dele havia se encerrado em Yakuza 6 e retornar com o personagem poderia estragar muito do peso que ele carregava.
Porém, o jogo usa o retorno do personagem para falar muito do tema principal do jogo: Como você encara seu próprio passado.
O jogo fala muito sobre redenção, reabilitação de criminosos, pessoas que tentam fugir do passado e pagam por isso e como as vezes você precisa lidar com seu passado de forma responsável para seguir em frente como uma pessoa melhor no futuro.
Kiryu tem muitas dores e sempre na série remói coisas de seu passado e carrega muito peso pra si e, consequentemente, acaba sendo uma figura que no estado atual se sente muito solitário. A dinâmica dele se envolvendo com Ichiban, um homem bobo alegre, extremamente expansivo que sempre faz de tudo pra por as pessoas na vida dele (o exato oposto de que Kiryu fez), gera dinâmicas e momentos muito bonitos.
O jogo chega a ser ousado e apontar coisas lá atrás, no primeiro jogo da série, antes vistas como bons momentos, hoje sendo vistas por Kiryu como um erro da parte dele.
Enfim, esse jogo da um outro olhar para o encerramento de Kiryu, e mesmo tendo falhas, principalmente em seu terço final, faz o personagem ter um ótimo arco no fim de tudo. Contudo, ele deu um sentimento de completude que se quebraria caso ele se torne protagonista em mais um jogo.
Like a Dragon/Yakuza sempre teve política em alguma instância, mas sinto que desde o título anterior ele aborda algumas questões de forma mais direta.
Aqui, o jogo estende o tema de Yakuza Like a Dragon, de como a sociedade não dá escolhas para pessoas marginalizadas. Ele é bem contemporâneo na forma que aborda fake news e como certas pessoas lidam com isso na internet, tanto na forma de piadas escrachadas quanto no drama de sua história principal.
Claro, o jogo ainda é um produto de uma empresa grande, então ele não vai muito a fundo em várias questões que aborda, mas só de me fazer pesquisar sobre leis japonesas e refletir sobre punitivismo já é um ponto forte.
Esse jogo consegue fazer o balanço perfeito da piada e do genuíno e ele faz isso por não ter vergonha de parecer ridículo. Uma reclamação muito comum em histórias de super heróis, é o quanto o roteiro sente a necessidade de colocar piadas em lugares indevidos num sentimento de admitir que é ridículo e tem um pouco de vergonha de si. Like a Dragon não tem medo de colocar uma luta épica com extrema carga dramática aonde um dos seus golpes dentro do jogo é algo extravagante e ridículo e seguir sem se ridicularizar por isso.
Temos substories muito marcantes por uma carga dramática forte e genuína em que há contextos absurdos e engraçados, mas no fim do dia é levado a sério na medida certa para não perder o drama.
É fácil enxergar Like a Dragon como uma paródia da vida real. Suas histórias retratam muitos absurdos vividos no cotidiano e extrapolam muitas coisas de maneira divertida, mas sem parecer cínico demais.
Aqui temos V-Tubers, influencers, IA dando errado, comentários ácidos sobre trabalhos insalubres e todo tipo de coisa que você pode imaginar, em todos os níveis possíveis
E isso funcionar de forma coesa é uma loucura
Infelizmente o jogo não lida bem com os dois protagonistas. Ao final do jogo ele acaba desfocando um pouco e apressando certas partes da história e esquecendo outras.
Devido a decisões que o jogo toma com Kiryu, existem certas inconsistências apesar de temáticas e momentos lindos.
E minha última reclamação é que o jogo não trabalha bem seus vilões, tendo um dos casts de antagonistas menos carismáticos da série, o que é um erro principalmente pelo seu tema de redenção.
Existe uma cena linda e tocante envolvendo um dos antagonistas, mas não por causa dele, mas sim porque Ichiban está envolvido e é um dos melhores protagonistas já feitos.
Sai vendo problemas na história principal do jogo, mas sua temática maravilhosa, personagens carismáticos, mundo imersivo e jogabilidade divertida me fazem perdoar muito seus erros.
Infinite Wealth é um jogo ambicioso e sua história as vezes sofre pela ambição, porém, ainda é um dos melhores jogos da franquia e com certeza vale a pena jogar.
Like a Dragon Infinite Wealth
Sega
Ryu Ga Gotoku Studio
PC, Playstation 4, Playstation 5, Xbox One, Xbox Series S|X