Crítica: Bloodless – Parry e pacifismo

Por Jean Kei

Nota: 9

Bloodless é um jogo de ação 2D em Pixel Art onde você controle Tomoe, uma Ronin antes conhecida como Retalhadora, mas agora jurando nunca mais empunhar uma arma. O jogo faz uma decisão artística de manter suas cores bem limitadas, e essa limitação gera um uso bem criativo. De fato, uma das coisas que mais chama atenção no jogo é como ele é muito bonito e como as cores se inserem bem. Me surpreendi um tanto com o com a coesão do jogo em sua arte e mecânica, inclusive.

Tomoe, a protagonista de Bloodless em seu barco

Bloodless é um jogo focado em parry

Parry (ou aparar no bom português) é provavelmente uma das mecânicas mais amadas dos videogames, você responder ao ataque do oponente e usá-lo contra si é algo super recompensador. Bloodless é um jogo todo centrado no conceito de parry e no desafio de executa-lo bem.

Como havia dito, Tomoe é pacifista e não empunha armas, então o jogo é todo baseado em contra-ataque.  Claro, esse tipo de mecânica exige uma precisão nos controles e oponentes bem balanceados, e Bloodless acerta bem nisso.

Aqui temos essencialmente duas maneiras de lidar com o combate: dar um impulso no momento certo de uma sequência de ataques para desarmar ou usar golpes para atordoar e em seguida desarmar o oponente.

Saber ler o inimigo e definir a melhor maneira de lidar é o centro do jogo. Contudo, os desenvolvedores miraram em dar liberdade e variedade, então existem habilidades distintas que lhe dão abertura para explorar o combate das duas maneiras. Você pode até encontrar a maneira mais eficiente de derrotar oponente X, mas dificilmente aquela será a única maneira viável.

Outra coisa que vale mencionar é como as cores fazem parte do combate. Como de costume, vermelho significa “perigo” e golpes em vermelho não tomam parry, mas existe uma janela de abertura para caso você ataque na hora certa antes do oponente executar o golpe, fazendo o perder bastante equilíbrio e ser facilmente atordoado. A janela de acerto em golpes vermelhos é bem mais exigente do que a janela para dar um parry, então é algo arriscado, porém recompensador. Venci algumas lutas rapidamente por conseguir atordoar o inimigo antes dele lançar um golpe para eu aparar com impulso. 

Tomoe, protagonista do jogo Bloodless aparando um golpe do oponente para desarma-lo

Mais desafiador do que frustrante

Me surpreendi com a dificuldade desse jogo, Bloodless é um jogo mais desafiador do que frustrante. Geralmente enfrentar poucos oponentes exige um pouco de leitura de movimento, mas o timing para aparar golpes é bem abrangente. Com algumas horas de jogo comecei a ter mais dificuldade, pois o jogo me botava para lidar com vários tipos de oponentes de uma vez, e mais adiante adicionando armadilhas pelo cenário. Tomoe possui uma barra de stamina, então abusar de parry à toa pode te punir. Lidar com vários inimigos, com a barra de stamina, de vida e de especial ao mesmo tempo é bem desafiador.

Do meio pra perto do final passei sufoco em várias lutas que ficaram intensas com tanta coisa acontecendo na tela, e com pouco espaço pra erros, já que sempre que me desesperava ficava sem stamina e apanhava. O final do jogo é mais fácil, porém. O jogo concentra muitos upgrades pra perto do fim do jogo, então senti que na pernada final minha Tomoe estava bastante poderosa pra lidar com o que der e vier. Das poucas reclamações que tenho do jogo, a curva de progressão é uma delas, mas não é nada que quebra o jogo pra mim. 

Outro ponto que sai positivo foi com a duração do jogo, no qual terminei com cerca de 10 horas e meia. Quando estava ficando cansado do jogo foi quando ele acabou, o que é sempre um bom sinal de algo que não é exaustivo mas não é curto demais.

cenário de batalha em Bloodless, com Tomoe pisando em armadilha e dois samurais prontos para ataca-la

E a narrativa também é um ponto mais forte do que parece

A narrativa de Bloodless não é algo totalmente novo, mas é bem executada o suficiente para me importar. Vejo que o jogo tomou inspiração de Samurai X e dos três mangás que o fã de Seinen médio conhece; Vinland Saga, Berserk e Vagabond. É a história de amadurecimento de alguém com um passado extremamente violento querendo deixar este ciclo de lado. 

Tomoe, traumatizada pela violência que tanto causou, fugiu de sua terra, mas agora volta para lidar com seus demônios passados e com a situação de guerra que o local está. A dificuldade acentuada do jogo conversa com essa narrativa, implicando que essas lutas difíceis seriam mais fáceis pelo caminho da violência. O tempo todo o jogo reforça como a violência é um ciclo vicioso e que a longo prazo não resolve conflitos, apenas cria novos e gera mais intolerância e ódio.

As cores funcionam bem para o clima da narrativa, com um vermelho se acentuando nos cenários e momentos mais violentos. A ambientação do jogo é um show a parte, inclusive.

O mundo do jogo não é muito grande, mas é gostoso de explorar e revisitar lugares conforme ganha acesso a novas partes dos lugares. Cada área tem uma cor de fundo para diferenciar bem o ambiente, e isso contribui para o ambiente do jogo sempre ter um ar novo.

O jogo também se presta a contar a história daquela terra através de cenário e descrição de monumentos. Você sabe um tanto sobre a religião e o passado do local e como isso reverbera nos personagens e na política do jogo.

Dito isso, para uma história que se preza em apresentar vários personagens e conceitos, senti falta de um glossário interno. 

cenário esverdeado com Tomoe infeliz com a presença de armas dentro de uma cabana.

Enfim, Bloodless é ótimo

Bloodless é um jogo quase perfeito e redondinho. Apesar de sentir que precisaria de algumas poucas melhorias na curva de progressão e dificuldade e de um glossário ou algo similar para dar notas em pontos da narrativa, sai do jogo muito satisfeito. O combate é gostoso e complexo, a arte é muito bonita e a narrativa funciona para lhe deixar interessado em ver o jogo até o fim.

E é um jogo que exige muito pouco de um computador, o que sempre é bom.

Nome do jogo:

Bloodless

Publisher:

3D Realms

Desenvolvedora:

Point N' Sheep

Plataformas Disponíveis:

PC