Crítica: Cult of the Lamb – Eu fundei um culto e não me arrependo disso

Escrito por Arthur Tayt-Sohn
Crítica

Desenvolvido pela Massive Monster e publicado pela Devolver Digital, Cult of the Lamb é um roguelike que propõe também algo um pouco diferente: e se você tivesse que fundar e gerenciar o seu próprio culto?

Peço desculpas ao querido amigo Padre Edson do Twitter, mas eu fundei o meu próprio culto e não me arrependo nem um pouco. Conheçam um pouco mais desse meu breve sacerdócio.

Cordeiros foram feitos para o sacrifício

O jogo se inicia com nosso simpático Cordeiro, que está caminhando rumo ao seu sacrifício. Como forma de impedir uma misteriosa profecia de se concretizar, os Quatro Bispos da Antiga Fé caçaram todos de sua espécie.

Após sua execução, o Cordeiro desperta e se encontra com Aquele Que Espera, um antigo deus que os Bispos querem impedir a todo custo que se liberte e retorne. Após fazer um acordo com esse misterioso deus, o Cordeiro recebe seu poder e retorna para o mundo dos vivos. Seu objetivo é simples: fundar seu culto, se fortalecer e se vingar dos Bispos.

Logo após o primeiro combate do jogo, conhecemos Ratau, que irá nos introduzir aos conceitos básicos do jogo de forma bastante intuitiva. Ele explica o básico sobre coletar recursos, recrutar seguidores, criar construções para seu culto e também exploração e combate.

O sacerdócio

Como líder do culto, você tem o dever de recrutar seguidores e suprir suas necessidades mais básicas, como alimentação, moradia e fazer cocô. Sim, é isso mesmo. Você também precisa delegar seus seguidores para realizar atividades como coleta de recursos e adoração, que servirá para aumentar o nível do seu culto e liberar novas construções.

Além disso, você irá construir um templo e nele irá realizar as atividades religiosas: sermões diários, rituais, ditar novas doutrinas, etc. Essas atividades têm efeito tanto no seu culto em si quanto no seu próprio personagem.

O sermão é a forma mais básica onde você irá progredir as habilidades do Cordeiro. É com essa função que você transforma a lealdade dos seus seguidores em sua própria força, liberando novas armas e habilidades. Se fortalecendo você estará preparado para exploração e combate.

São diversas outras construções que também irão ajudar no desenvolvimento do culto e do personagem. Inicialmente boa parte do trabalho será bastante manual: plantar alimentos, minerar pedras, limpar o cocô dos seguidores, etc. Para os jogadores que não curtem tanto gerenciamento, uma boa notícia: em um ponto do jogo você irá conseguir automatizar a maioria dessas atividades, podendo se dedicar mais à exploração.

O crescimento do culto também é fundamental para o avanço no jogo. São quatro biomas exploráveis e para abrir a porta de cada um, é exigido um número mínimo de seguidores. Então você inevitavelmente precisará dedicar um tempo ao desenvolvimento do culto. Recrutar os seguidores, melhorar a lealdade deles, etc.

As necessidades básicas do culto são três: fome, higiene e fé. Para lidar com a fome você precisa cozinhar para os fiéis. A higiene é mantida limpando a sujeira feita por eles e dando um fim apropriado para os cadáveres dos seguidores mortos. E a fé é mantida realizando sermões, rituais e conversando com os seguidores.

Alguns rituais podem diminuir os níveis de fé, mas ao mesmo tempo dar alguma vantagem temporária. É possível por exemplo sacrificar um seguidor em troca de bastante poder para desbloquear habilidades do Cordeiro.

As doutrinas também vão ajudar no seu progresso. Ao juntar três pedaços de uma pedra da lei, é possível determinar uma nova doutrina. São cinco categorias e cada uma delas te dá duas opções para escolher uma. Sua escolha vai variar dependendo do seu objetivo.

A parte do gerenciamento do culto é muito importante e conversa muito bem com as mecânicas do jogo. Eu senti que não houve um desperdício de mecânicas no jogo, muito pelo contrário. Tudo tem um propósito e vai ser aproveitado de acordo com a forma que você decidir jogar.

É possível por exemplo realizar rituais que diminuem a fé, para acelerar o desenvolvimento do Culto e do Cordeiro. Ao mesmo tempo, construir uma prisão e uma máquina de propaganda para impedir que rebeldes acabem com o seu culto.

Eu por exemplo optei por não ter prisões e adotei a doutrina da Absolvição, que diariamente me garantia bônus de fé por não ter prisioneiros. Foi um meio que demorei mais para alcançar meus objetivos, porém achei mais sustentável.

Além do próprio culto, conseguimos recursos em outras localidades que liberamos ao decorrer do jogo, como um cais, uma floresta de cogumelos, entre outros. Além de recursos, como peixes, podemos realizar diversas atividades não essenciais, mas que podem ajudar na sua missão ou simplesmente dar recompensas cosméticas.

E são muitas recompensas, o jogo conta com pisos, estátuas e mais dezenas de objetos decorativos para o seu culto. Apesar de eles não darem bônus diretos para o desenvolvimento do seu culto, são uma forma de deixar sua “casa” do jeito que você gosta. Mas novamente, é totalmente opcional e você não precisa se preocupar muito com isso.

Apesar de contar com mecânicas simples, o gerenciamento do jogo é bastante interessante e oferece muitas opções. Não há um jeito certo de jogar, seu culto vai funcionar do jeito que você acha mais adequado para o seu estilo de jogo.

O único porém é que realmente durante esse início até o meio do jogo, ele irá exigir um pouco de dedicação ao desenvolvimento do culto. Afinal, é dele que você irá absorver o poder para se tornar mais forte e abater os Bispos da Antiga Fé. Isso pode ser um ponto negativo para os jogadores que realmente não gostam de mecânicas de gerenciamento.

Caçando hereges

Além do culto, o Cordeiro precisará caçar os Quatro Bispos da Antiga Fé, que aprisionaram o deus que te devolveu a vida e deu a Coroa Vermelha e seu poder. Para isso, você precisará explorar quatro biomas gerados proceduralmente.

No início de cada run, você receberá uma arma e uma maldição, que são as magias do jogo. O Cordeiro então irá explorar esses biomas, com mapas semelhantes ao de Darkest Dungeon. Os mapas contam com inimigos, recursos e recompensas.

Além disso, você encontrará NPC’s que podem te ajudar no caminho. Um cartomante irá tirar cartas que vão te conceder alguns bônus temporários para essa run. Você também irá encontrar vendedores de itens, aliados que vão te curar e mais seguidores para converter ao seu culto.

No final de cada área você irá enfrentar um subchefe e retornará para o Culto. Repetindo isso quatro vezes a porta do tempo do Bispo ficará disponível e você pode desafiar o herege que domina aquela área. Cada chefe derrotado irá destruir uma das correntes que aprisiona Aquele que Espera.

Nesse ponto o jogo conta com mecânicas simples. Além dos dois ataques, você possui uma esquiva. A maldição consome Fervor, uma energia mágica que pode ser recuperada eliminando inimigos ou abrindo baús.

São diversos tipos de armas, indo das mais leves como adagas e espadas até a mais pesada, uma marreta extremamente lenta mas com dano colossal em área. Essas armas também podem aparecer com efeitos especiais, como envenenamento ou roubo de vida.

No geral não existem muitas estratégias para serem seguidas, porque as armas são aleatórias e são incomuns os momentos em que novas armas aparecem em sua run para que você possa trocar. Foram poucos os momentos que eu troquei.

Apesar das mecânicas serem simples, elas são polidas e o combate é divertido. Há uma variedade de inimigos que dependendo do tipo de ataque vão exigir uma estratégia diferente. Normalmente os mini chefes e chefes possuem ataques parecidos com os inimigos daquela área, mas aprimorados.

O que é uma escolha de game design interessante ao meu ver, porque o jogo te ensina os diversos golpes dos inimigos durante seu caminho e apresenta uma versão aprimorada desses golpes no final. Então ele não exige que você aprenda todo os movimentos dos inimigos, você já os conhece e só precisa se adaptar à forma que o chefe utiliza esses golpes.

A maior dificuldade ocorre quando você dá o azar de pegar armas e maldições que não se adaptam bem ao tipo de inimigo que você está enfrentando. Um inimigo que ataca rápido te coloca em desvantagem se você estiver usando a marreta, por exemplo. Apesar disso, o jogo não é tão punitivo quanto um Hades por exemplo. Mesmo em desvantagem você consegue vencer os inimigos com um pouco mais de paciência e cuidado.

A parte de exploração do jogo é bastante linear. Você irá avançar de um bioma para o outro até o final do jogo. É possível revisitar biomas já vencidos, onde você irá encontrar versões mais fortes dos inimigos e terá acesso à algumas recompensas extras e atividades opcionais.

As runs também são bem contidas e rápidas. Algumas eu cheguei a fazer em menos de 10 minutos, levando menos de uma hora para completar uma área inteira. Isso faz sentido porque você precisa também se dedicar ao gerenciamento do culto. Conforme você avança no jogo e automatiza algumas atividades do culto, é possível permanecer mais tempo nos biomas.

Isso é ótimo para quem não tem muito tempo para se dedicar. Dá pra você fazer runs no intervalo do trabalho ou dos estudos, por exemplo. E ao final você pode só se dedicar um pouco aos afazeres do culto, salvar e continuar depois.

O ritmo do jogo é bem interessante e sua duração é o suficiente para entregar o conteúdo principal dele e não se tornar repetitivo. Caso você queira passar mais tempo desenvolvendo o culto ou coletando o restante dos itens colecionáveis, também pode se dedicar e garantir mais ou menos o dobro de horas se fizer apenas as missões principais.

Esse é um ponto bastante positivo do jogo. Ele sabe o momento de terminar e ao mesmo tempo te dá a opção de realizar mais atividades se quiser. Dessa forma ele não se torna cansativo e repetitivo.

Um desenho da Cartoon Network feito pelo H.P. Lovecraft

Os visuais de Cult of the Lamb são o grande destaque do jogo. Eles são bastante bonitos e claramente inspirados em Lovecraft. A aparência dos Bispos da Antiga Fé já entrega de cara esse inspiração, que é uma releitura muito fofa do horror cósmico.

O jogo utiliza cores vibrantes lindíssimas que casam perfeitamente com seu visual cartunesco. E não são só muito coloridos como também bastante detalhados.

Desde às construções até o design dos seguidores e monstros, todo o visual é bastante caprichado. Me senti jogando uma versão satânica da Mansão Foster para Amigos Imaginários. Um misto entre o fofo e o profano. Excelente para crianças!*

O mesmo se aplica às animações, que são muito fluídas e bonitas. As informações visuais na tela são bastante claras e você consegue distinguir bem o que está acontecendo, os tipos de ataques que você precisa se defender, etc.

Somente em alguns momentos de lutas com chefes que a câmera se afasta muito e fica um pouco difícil de enxergar inimigos e partículas menores, mas são momentos muito pontuais em que isso ocorre.

Os efeitos sonoros também são muito bem feitos e ajudam no combate. Os ataques possuem sons distintos que facilitam identificar e saber como agir para se defender. Os seus próprios ataques também possuem diferentes sons e há um som bastante específico para os críticos.

A trilha sonora não é um dos maiores destaques do jogo, mas não é ruim. E isso já é bastante suficiente e talvez pelo ritmo do jogo ser até um pouco mais acelerado, você nem tenha tantas oportunidades para ficar ouvindo a trilha sonora do jogo.

Fé nos cordeiros

Cult of the Lamb segue a tradição da Devolver como um jogo divertido e que explora temáticas e estética um pouco não convencionais. Ele chama logo a atenção pelo seu visual carismático, mas também conquista por ser um jogo de ação roguelike bastante divertido e com personagens engraçados e roteiros com um humor negro bastante suave.

Balanceando bem exploração e gerenciamento, o jogo entrega uma quantidade satisfatória de horas de gameplay e ainda oferece conteúdo adicional caso você queira explorar mais ainda. Sidequests, minigames, ir atrás de colecionáveis, etc.

Ele não é complexo no gerenciamento a ponto de se tornar maçante nem brutal demais como em roguelikes mais tradicionais, sendo perfeito para agradar a maioria do público mais casual. Ao mesmo tempo que apresenta essas duas mecânicas de jogos que você pode se aprofundar mais se curtir.

A Devolver inclui mais um bom jogo em seu catálogo, que eu recomendo bastante que você explore pois sempre tem bastante coisa bacana sendo publicado por eles.

*Este profano redator e o culto site Game Lodge não se responsabilizam pelo uso indevido deste jogo por crianças.

Nome do jogo:

Cult of the Lamb

Publisher:

Devolver Digital

Desenvolvedora:

Massive Monster

Plataformas Disponívies:

PC, Playstation 4, Playstation 5, Xbox One, Xbox Series S|X, Nintendo Switch

Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge