Crítica: Hazel Sky – amadurecimento e os perigos do rádionamoro

Escrito por Arthur Tayt-Sohn
Crítica

Se há algo que todos nós passamos em nossas vidas, são as mudanças de fases. Adolescência, vida adulta, assumir responsabilidades, etc. Hazel Sky é um jogo sobre encontrar seu papel no mundo, ou na versão limitada que nos oferecem dele. E o que nos aguarda no fim dessa jornada?

Produzido pelo estúdio brasileiro Coffee Addict, o jogo é focado em narrativa, exploração e solução de puzzles. O objetivo do jogo é visitar as ilhas que a família Casey utiliza a gerações em um ritual para a formação de novos Engenheiros.

Você é Shane, filho de Flynn Casey, o atual braço direito do Engenheiro de Gideon. Nesse mundo quase desolado, os humanos vivem em cidades flutuantes como Gideon. Essa cidade divide sua sociedade em Engenheiros e Artistas.

Os primeiros são a classe mais privilegiada. São responsáveis por manter a cidade funcionando e a sociedade em ordem. Os Artistas são a casta mais baixa da sociedade. A arte em geral é proibida em Gideon, considerada uma praga.

Para aceitar novos Engenheiros na cidade, os aspirantes devem realizar um ritual de passagem. Construir sua própria máquina voadora para voltar à Gideon. E assim como todos os outros, Shane deverá passar pela mesma provação.

Para piorar a situação, Gideon está passando pela iminência de uma revolução, onde os Artistas desejam se libertar de toda a opressão que vêm sofrendo dos Engenheiros por muito tempo. Então há um senso de urgência em seu teste.

Os testes

Chegando na primeira ilha, somos apresentados a um tutorial básico de comandos. Também encontramos nosso primeiro esquema de máquina a ser montada, um pequeno avião. No local também podemos encontrar livro e um violão.

Curiosamente, Shane possui aptidão para música e sabe tocar o violão, algo que é proibido em Gideon para sua classe social. E a música tem um papel importante nesse jogo. Avançando um pouco, encontramos nossa primeira máquina a ser consertada e o cadáver de um primo de Shane, com um estranho aviso para nosso protagonista.

Ao tentarmos decolar, não chegamos muito longe. Shane cai em uma ilha próxima e fica desacordado por um tempo. Nessa ilha encontramos o rádio onde iremos nos comunicar pelo resto do jogo com uma misteriosa garota chama Erin, que está também realizando os seus testes.

Daqui em diante a estrutura de mecânicas do jogo não muda muito. Devemos reparar as máquinas que encontramos pelo caminho e avançar para o próximo teste na ilha seguinte. Os puzzles são bem simples, não oferecendo grandes desafios.

Os testes consistem basicamente em encontrar as peças e materiais necessários para reparar as máquinas e então realizar os reparos. Em alguns momentos você irá se deparar com esses pequenos puzzles. Utilizar itens específicos para abrir caminhos, controlar um guindaste para reparar um oleoduto, etc.

De forma geral, o jogo tem mecânicas bem simples. Andar, correr, coletar itens e realizar os puzzles que ele oferece. Isso pode ser um problema para quem gosta de um pouco mais de desafios, mas também soa como um alívio para quem está mais interessado na narrativa dele.

O mundo de Hazel Sky

Como falado anteriormente, Shane vive em uma cidade flutuante, mas o mundo é bem maior que isso, naturalmente. E ele é apresentado de forma sútil ao jogador. Afinal, Shane não é exatamente alguém que viajou muito por aí e conheço muito pouco do mundo externo. Então é natural que ele não esteja familiarizado com as informações que encontra pelo caminho.

Os desenvolvedores tiveram o cuidado de criar uma mitologia em torno desse mundo. Conforme avançamos pelo jogo, iremos nos deparar com livros e documentos que dão mais informações sobre o que há além de Gideon, bem como um pouco de sua origem.

Descobrimos sobre os ideais dos Engenheiros, que por vezes soa até como algo religioso, por mais que eles pareçam agir totalmente conforme a lógica. Também entendemos um pouco mais das motivações dos Artistas e coisas que Shane jamais sonhou em saber: seres místicos, um estranho culto, outras cidades que se organizam de forma diferente.

O mais interessante é a forma que isso é apresentado ao protagonista. Bem, ele está em uma ilha que pertence à sua família por gerações e tem acesso facilitado a conhecimentos que poderiam levá-lo preso ou sabe-se lá mais o que, se ele fosse pego com esses materiais em Gideon.

O teste então fica parecendo não apenas uma provação para se tornar um Engenheiro, mas também um teste de autoconhecimento. Ser um Engenheiro é algo que você realmente deseja? Preservar seus dogmas aprendidos desde criança ou explorar mais diferentes formas de conhecimento?

Me parece uma grande metáfora sobre o próprio autoconhecimento que passamos por diversas fases de nossa vida. Além de tudo isso, Shane possui uma grande responsabilidade em suas mãos: ele deve retornar à Gideon e se unir a seu pai no meio de uma revolução dos Artistas?

A qualidade dos materiais escritos que encontramos é muito bom, destoando um pouco dos diálogos, que por vezes não passam a emoção que deveriam. Parte desse autoconhecimento adquirido por Shane se dá pelos diálogos com Erin. No geral o desenvolvimento entre eles é bastante interessante, exceto em alguns momentos pontuais que a conversa parece não ser concluída satisfatoriamente.

Um ponto bem específico onde isso se tornou um grande problema em minha jornada, foi quando Shane tem uma importante revelação sobre sua vida e não esboça uma reação sobre isso. E não foi somente pela dublagem, mas pelo próprio diálogo em si que poderia ter um peso a mais.

O tempo de jogo também poderia ser um pouco maior, para desenvolver mais o mundo e sua lore. Eu fiquei realmente interessado na forma que os desenvolvedores construíram o mundo, mas senti que ficou faltando mais coisas para descobrir, algo que algumas horinhas a mais teriam resolvido.

E apesar de eu não ser contra conclusões abertas à interpretações, o jogo acaba sendo meio corrido e nos deixa com muito mais perguntas do que o que acho razoável. Quando começamos a entender melhor alguns pontos da história, ele acaba e nos deixa querendo saber mais sobre o que está se passando nesse mundo.

Sons e visuais

Um dos pontos mais marcantes do jogo é certamente a trilha sonora. Bom, logo no começo já descobrimos que a música tem um papel importante na vida de Shane e isso se reflete durante todo o jogo.

A começar pela trilha sonora que toca enquanto jogamos. É extremamente prazeroso explorar ouvindo o violão ao fundo. Sério, em alguns momentos eu simplesmente fiquei parado só apreciando a música que estava tocando.

Também encontramos algumas músicas escritas que podemos aprender a tocar apenas replicando as cifras, semelhante com a forma que tocamos música em The Last of Us 2. São diversas composições, todas cantadas. Infelizmente elas não estão disponíveis no Spotify. Sim, eu procurei. Enquanto procurava acabei encontrando uma nova playlist de lo-fi, então obrigado assim mesmo aos desenvolvedores.

Enquanto ouvimos a trilha sonora calma do jogo, iremos explorar diversas ilhas que são pequenas e simples, mas bastante coerentes com a proposta do jogo. Em nenhum momento eu fiquei perdido no que eu precisava fazer ou onde precisava ir.

E por outro lado, o jogo recompensou meu lado explorador. Existem diversos locais ocultos e segredos para serem encontrados nas ilhas. Desde documentos, livros e mais objetos que contam um pouco mais a história de Gideon e desse mundo, até coisas mais “ocultas”.

Houve apenas um momento que tive problemas com a exploração, tentando entrar em um local que aparentemente parecia inacessível mas na verdade eu precisava “ativar” o evento que abriria um buraco no telhado, encontrando um documento meio aleatório pelo mapa.

Os gráficos são simples mas caprichados. Apenas em alguns momentos há uma certa estranheza nos modelos dos personagens, mas todo o resto é bastante bem feito, com bastante variedade de construções, apesar de estarmos em pequenas ilhas.

Conclusão

Após minhas relativamente curtas horas de jogo, Hazel Sky foi um jogo que demonstrou grande potencial, mas que acabou sendo prejudicado pela curta duração.

Apresentando um mundo interessante de se conhecer, documentos bem escritos, ótima trilha sonora que deixou a exploração bem satisfatória, o seu final abrupto deixa aquela sensação de “mas já?”

O fato também de a conclusão da história ter sido mais inconclusiva do que deveria ser, piora um pouco mais essa sensação. O último capítulo, por exemplo, é muito corrido. Importante informar que o jogo conta com um final secreto que adiciona mais uma camada na conclusão do jogo, mas que também deixa mais perguntas em aberto.

Esse não é o primeiro jogo do estúdio e é evidente que ele está evoluindo com o tempo. Blade & Bones já tinha sido elogiado pela sua arte e esse padrão se manteve em Hazel Sky. Certamente é um estúdio brasileiro que devemos acompanhar e que tem tudo para entregar um novo jogo ainda melhor que os dois primeiros.

Nome do jogo:

Hazel Sky

Publisher:

Neon Doctrine

Desenvolvedora:

Coffee Addict Studio

Plataformas Disponívies:

PC, Playstation 4, Xbox One, Nintendo Switch

Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge