Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge
Um carro, uma entrega e um sonho: chegar em segurança. Desenvolvido pela Ironwood Studios, Pacific Drive busca inspirações na ficção estranha de Piquenique na Estrada, que inspirou Stalker, jogos de extração e em viagens roadtrip, que aqui são tudo menos tranquilas e relaxantes.
Tivemos a oportunidade de viajar pela Olympic Exclusion Zone e contamos como foi nosso “passeio”.
O jogo se inicia quando Driver (o motorista) está realizando uma entrega e acaba se aproximando demais da Olympic Exclusion Zone, uma zona de exclusão localizada no noroeste dos Estados Unidos.
A organização ARDA realizou diversos experimentos no período da Guerra Fria, o que resultou no surgimento de diversas anomalias que obrigaram o governo a murar e isolar totalmente a área.
Uma das anomalias acaba sugando Driver e seu carro para dentro da zona da exclusão, o que normalmente resultaria em uma morte certa. Por sorte, ou azar, Driver sobrevive e acaba encontrando um carro convenientemente funcional parado em uma garagem.
Ao entrar no carro, você descobre que existem alguns habitantes ainda na zona de exclusão e com a ajuda deles consegue chegar à uma garagem segura, onde você conhece a terceira habitante da zona de exclusão.
Para piorar a situação do motorista, os três habitantes da região que você “conhece”, isso em bastante aspas porque você só consegue ouvir o que eles falam, pois seu rádio não permite manter uma comunicação bilateral, informam que o carro é um Remnant.
Remnants são “objetos” com propriedades anômalas, que podem eventualmente se interessar por seres humanos. Alvos desse interesse se tornam obcecados com esses objetos e acabam por enlouquecer. Então seus três novos amigos, Oppy, Francis e Tobias, que se revelam como cientistas que trabalharam para a ARDA, se comprometem a ajudar você a escapar da zona de exclusão antes que você enlouqueça.
Pacific Drive é um jogo extremamente focado em suas mecânicas, seu ponto mais forte. Me chamou atenção como ele é um jogo metódico, que exige do jogador planejamento e realização de ações bastante manuais.
Logo de início você aprende sobre como é dirigir no jogo, que te ensina a virar a chave para ligar o carro, alterar a marcha para o modo “drive” e também como ligar os limpadores e os faróis.
Ao chegar na garagem são apresentadas novas mecânicas, sobretudo sobre a preparação das suas viagens. Também é possível customizar o carro totalmente com melhorias e alterando sua estética. Conforme você acumula recursos, consegue liberar novas estações de trabalho e mais melhorias.
Após o carro estar pronto, é possível traçar a rota que você seguirá e seguir viagem. No mapa você consegue visualizar os pontos de interesse que você quer visitar e quais são as condições daquele local, seja em quantidade de recursos, clima ou atividades de anomalias.
Você deve visitar essas áreas, coletar o máximo de recursos possível e utilizar globos de energia, coletados no mapa, para abrir um portal de volta para a garagem. Em alguns casos sua rota fará você atravessar mais de uma área antes disso.
Mas em que o jogo se diferencia? Pacific Drive é um jogo de dirigir, então é evidente que essa é a principal mecânica dele. O ato de dirigir no jogo é um aprendizado. Imagine que você precisa dirigir em um país onde você não conhece bem as regras de trânsito, é mais ou menos isso.
No caso de Pacific Drive, as novas regras de trânsito podem te matar. Você precisa se preparar equipando seu carro com melhorias para deixa-lo mais resistente, abastecer, recarregar as baterias e utilizar os pneus adequados.
As vezes também será necessário realizar pequenos reparos e trocas de peças durante suas viagens. Precisa trocar o pneu? Remova o antigo e insira o novo. Recarregar a bateria? Abra o capô e só assim tenha acesso à bateria para recarrega-la.
Tudo no jogo é bastante manual, exigindo que você entenda os seus sistemas. Isso diferencia Pacific Drive por ser um jogo que busca essa imersão do jogador com seu carro. Podemos chamar ele de roadtrip immersive sim? Quem sabe.
Além de precisar coletar recursos e cuidar do seu carro, você irá encontrar diversas anomalias na Zona. Essas anomalias são resultado dos experimentos da ARDA e se manifestam de diferentes formas. Torres que disparam raios de energia quando você se aproxima, gêiseres que surgem no chão de repente, objetos metálicos que grudam no carro e causam efeitos variados e também o maldito “turista”.
Essa última anomalia especificamente, provavelmente idealizada por um fã de Doctor Who, tem uma aparência de manequim. Como os Weeping Angels da série, eles conseguem se aproximar de você quando não estão sendo observados. E é óbvio que eu me assustei diversas vezes com eles dirigindo a noite.
Conforme você dirige pela Zona de Exclusão você entende melhor essas “novas regras de trânsito” e ganha mais confiança dirigindo. Assim como voltar para a auto-escola. Você aprende mais sobre as anomalias e seus efeitos e com isso dirigir vai se tornando menos perigoso.
E assim como o personagem vai se tornando obcecado pelo carro, você também desenvolve uma relação com ele, entendendo melhor como ele funciona e o ato de dirigir vai se tornando cada vez mais natural. E quando digo “entender”, é até mesmo entender o “comportamento” dele.
Isso por conta de uma mecânica muito interessante chamada “quirk”. Em determinados momentos o carro pode adquirir alguns status e quase se tornar senciente. Uma coisa meio Herbie, o Fusca.
Ao adquirir uma quirk, podem ocorrer diversos comportamentos inesperados. No meu caso, houveram momentos onde conforme eu girava o volante para um dos lados, os faróis lentamente iam se apagando. Em outro momento, sempre que eu ligava ou desligava os limpadores de para-brisa, uma das portas abria.
Você consegue resolver isso utilizando uma máquina específica, onde você deve identifica exatamente o que está causando o comportamento. A partir daí você consegue dar um diagnóstico e resolver o problema.
Pacific Drive utiliza de maneira inteligente suas mecânicas para criar uma maior imersão e situações bastante inusitadas e até cômicas. Em um momento eu cheguei a esquecer de colocar a marcha do carro no modo estacionar e fui buscar gasolina. Na volta observei o meu carro voltando rua abaixo.
O jogo utiliza as mecânicas, físicas e os conceitos da ficção estranha, como anomalias e eventos climáticos absurdos, para tornar ele um “roadtrip” bastante único. Por mais que existam alguns momentos de calmaria, onde você só curte a viagem, a tensão nunca vai totalmente embora.
E em alguns momentos ele consegue ser apavorante. Tentar chegar até o portal de volta para a garagem enquanto uma tempestade anômala extremamente violenta e mortal, resultado de experiências de cientistas com muita criatividade e pouco apreço cautela, pode ser uma experiência e tanto.
Aliado a isso, o jogo conta com uma rádio com uma trilha sonora bastante gostosa de ouvir e diversa de ritmos musicais, algumas vezes interrompida por algumas transmissões misteriosas, é claro.
Meu grande problema com o jogo foi ter dificuldade de acompanhar os diálogos, pois os personagens muitas vezes conversam entre si em momentos que você precisa prestar atenção na estrada.
Isso piora ainda mais com a falta de legendas em português. Por ser um jogo que se apoia em diversos sistemas, alguns complexos, não entender o que está escrito na tela prejudica bastante a experiência dos não falantes dos idiomas disponíveis. Fora que também prejudica o entendimento da história, que além dos diálogos tem muitos textos e transmissões que acrescentam mais contexto à história do jogo.
Pacific Drive é um jogo para quem gosta de sistemas e para quem não se importa em gastar tanto tempo se preparando quanto dirigindo. Assim como uma roadtrip, você não simplesmente pega seu carro e dirige sem rumo sem preparar. Ou pelo menos eu espero que você não faça isso.
Mesmo que você não se engaje tanto com a história dele, e confesso que em alguns momentos eu perdi um pouco o interesse nela, talvez um problema causado por mim mesmo devido a expectativa pelo jogo ser inspirado em uma obra tão icônica, ele ainda é um jogo bastante divertido e com sistemas interessantes.
Você pode perder uns 30 minutos ou mais mexendo no seu carro na garagem, ouvindo a farta playlist que o rádio oferece e depois seguir viagem, coletar recursos e voltar para casa inteiro, ou quase. Isso enquanto precisa lidar com as anomalias mais bizarras possíveis, e aprender um pouco mais sobre elas. Talvez elas nem sejam tão ameaçadoras assim, sabe? Menos vocês, turistas. Eu odeio vocês.
A Ironwood Studios criou um jogo que traz diversas inspirações que não são novidade, como ficção estranha, histórias de anomalias e zonas de exclusão, jogos de extração, amor por carros e cientistas malucos, mas conseguindo criar uma experiência única ao combinar em um jogo com mecânicas bem elaboradas e divertidas, além de uma direção de arte que consegue reproduzir bem uma típica região meio isolada dos EUA em um cenário de ficção.
Pacific Drive
Kepler Interactive
Ironwood Studios
PC, Playstation 5