Crítica: Tchia é um jogo sobre afeto

Escrito por Arthur Tayt-Sohn
Crítica

Desenvolvido pelo estúdio Awaceb, Tchia chamou atenção devido ao seu visual e sua proposta de um mundo aberto, inspirado na região da Nova Caledônia, um pequeno arquipélago no Oceano Pacífico.

Tive a oportunidade de conhecer esse lindo lugar e conto sobre minha experiência com o jogo.

Um paraíso no meio do oceano

Em uma breve introdução, os desenvolvedores do jogo contextualizam a história de Tchia. Somos apresentados à Nova Caledônia e um pouco de seus habitantes e cultura. A Awaceb faz questão de pontuar a importância do arquipélago para a vida dos criadores do jogo.

Por conta disso, o jogo é dublado apenas em francês e no idioma local drehu, as línguas faladas em Nova Caledônia. Além disso, o jogo conta com a participação dos próprios habitantes do local na dublagem e na trilha sonora do jogo. O jogo é, acima de tudo, uma carta de amor à Nova Caledônia.

Após as apresentações, o jogo se inicia na pequena ilha de Uma, onde Tchia vive com seu pai, Joxu. Eles vivem isolados do restante dos povoados do arquipélago, mantendo contato apenas com Tre, fiel amigo que de tempos em tempos visita a ilha levando suprimentos.

Após uma introdução que explica as mecânicas básicas do jogo, um homem misterioso acompanhado de criaturas estranhas aparece em uma aeronave e sequestra o pai de Tchia. Nesse momento ela desperta seu poder, que é uma das marcas registradas do jogo: a transferência de alma.

Após ser resgatada por Tre, Tchia parte em busca de seu pai. Sua primeira pista se encontra na cidade, onde deve encontrar Meavora, temido governante do arquipélago e que provavelmente está com seu pai mantido em cativeiro.

Explorando Nova Caledônia

Logo de início liberamos as diversas mecânicas e ferramentas que servirão de base para a exploração do arquipélago. Tre entrega para Tchia seu barco, uma bússola e outros itens. A partir daí podemos partir para a cidade.

Chegando no escritório de Meavora, descobrimos que para conseguir uma audiência com ele deveremos coletar diversos itens para criar um coutume, uma oferenda tradicional da região que levamos como prova de boa-fé ou de amizade ao visitarmos alguém. Esse é um dos costumes da Nova Caledônia que são apresentados no jogo.

A base do jogo inteiro é explorar e coletar itens, com alguns minigames adicionais. Normalmente ao realizarmos as missões nos vilarejos que encontramos, há uma sequência musical onde iremos tocar o ukulele de Tchia ou algum outro instrumento musical tradicional.

Esses segmentos podem ser automatizados, para que você não precise ficar acertando as notas. É importante destacar que o jogo é bastante acessível e amigável, punindo muito pouco o jogador por erros.

A maioria das mecânicas do jogo foi criada pensando em apresentar os costumes e o modo de vida da Nova Caledônia para o jogador. Além de tocar instrumentos musicais, existe o minigame do totem, onde criamos essas estatuetas de madeira que são utilizadas para avançar na história e também para conseguir melhorias para Tchia.

O mapa do jogo é relativamente grande e percorrer a pé pode ser demorado e um pouco cansativo. Isso foi uma preocupação que eu tive no começo mas avançando um pouco no jogo liberamos meios bem ágeis de transporte.

Com a transferência de alma, podemos assumir qualquer animal e alguns objetos. Com isso é bastante fácil se transformar em um pássaro e cruzar longas distâncias até o seu objetivo. Também é possível se catapultar em árvores para alcançar longas distâncias com ajuda do seu planador.

O jogo me surpreendeu pela quantidade de mecânicas. Apesar de não utilizarmos todas, houve um cuidado para que cada animal fosse único. O caranguejo por exemplo pode pinçar cordas e correntes para liberar baús. Também é possível assumir o controle de uma galinha e fazer ela colocar ovos. Gatos possuem visão noturna, que podem te facilitar a noite.

A exploração do jogo também não impõe um ritmo ao jogador. Existe um lado positivo e um negativo na forma que ela foi desenvolvida. Isso porque o jogo não tem um marcador que mostra exatamente onde Tchia está no mapa. É possível marcar a localização atual encontrando algumas placas indicativas.

Como o jogo não impõe uma quantidade muito grande de objetivos no seu mapa, ele incentiva um pouco mais a exploração livre e no seu tempo. E por ser um jogado pouco focado em ação, isso acaba sendo relaxante.

O arquipélago conta com paisagens bastante bonitas e com muita fauna e flora. Além disso, o jogo conta com passagem de tempo, então você consegue apreciar a beleza das ilhas em diversas horas do dia. Logo no início você adquire uma câmera, então também é possível tirar boas fotos.

Por outro lado, há uma chance de você ficar um pouco perdido para encontrar alguns objetivos que você precisa realizar. Eu demorei um tempinho para encontrar as pérolas que eu precisava para um coutume, por exemplo. Não chegou a me frustrar, mas isso pode variar de acordo com a experiência de cada um.

Além dos objetivos obrigatórios, o jogo conta com muitas atividades extras totalmente opcionais. As recompensas são em sua maioria estéticas, normalmente novas roupas para Tchia ou decorações para seu barco.

Apesar de alguns poucos segmentos de combate, esse não é muito o foco do jogo. A maior parte dele foca em exploração e coleta de itens. Para falar a verdade o combate no jogo é até bastante desnecessário, apesar de não prejudicar totalmente a experiência.

Normalmente o combate consiste em assumir o controle de alguns lampiões ou galões de combustível para incendiar inimigos feitos de tecido. Fora isso, prepare-se para explorar bastante.

Felizmente o jogo conta com mecânicas bem polidas de exploração e é bem tranquilo navegar pelo arquipélago. Em montanhas é possível descer de planador ou escorregar em alta velocidade. Você também pode assumir o controle de algum animal bem rápido ou até mesmo voador.

Viu um belo coqueiro? Não hesite em subir nele e utilizá-lo como catapulta. Você também consegue assumir o controle de um coco, arremessa-lo longe e sair do seu controle, assumir novamente o controle e finalizar com um planador, tudo isso aproveitando a boa física que o jogo proporciona.

Se estiver se sentindo mais no pique marinheiro, também pode utilizar o barco de Tchia para ir de uma ilha à outra, ou até mesmo viajar entre os vilarejos que contam com boas e velhas docas. E claro que também é possível utilizar viagem rápida pelas docas, caso você esteja com pressa demais.

Tchia é um jogo que permite que você jogue no seu ritmo, não exigindo que você faça atividades opcionais para melhorar seu personagem para um desafio grande à frente. Suas recompensas por explorar são basicamente estéticas e conhecimento, já que durante a exploração o jogo te apresenta os animais e a flora local, mais do folclore da cultura da Nova Caledônia ou simplesmente belos visuais para você tirar fotos.

Uma história leve e com muito afeto

A história de Tchia é bastante simples e direta. Seu principal objetivo é resgatar o pai de Tchia, mas isso se desenvolve para alguns outros objetivos maiores com o decorrer de jogo.

Enquanto você explora o arquipélago para concluir seus objetivos, você vai conhecendo novos personagens, vilarejos e culturas. É uma história que envolve bastante afeto, não só entre os personagens mas também entre os desenvolvedores, sua própria história e seu lar.

Um dos grandes diferenciais de Tchia é como sua história tem uma identidade muito característica e como o jogo faz questão de apresentar a Nova Caledônia para o jogador. Conhecemos um pouco do idioma local, dos costumes, folclore, músicas, danças, gastronomia, etc.

Conforme você avança na história, uma narradora explica alguns conceitos para que aqueles que não estão familiarizados com a cultura local entendam o significado do que está sendo contado na história. Em alguns momentos são os próprios personagens que fazem isso.

Com o tempo vamos observando Tchia amadurecer e assumir responsabilidades, passando também por momentos tristes e de despedidas. Mas o jogo também conta com alguns segmentos de humor e muitos segmentos musicais, parte importantíssima da cultura da Nova Caledônia.

No geral a história do jogo é contada com bastante leveza, com diálogos simples e que mostram o dia a dia do arquipélago. O jogo é relativamente curto, então a história também não se arrasta mais do que deveria.

Além do principal conflito do jogo, a busca de Tchia pelo seu pai e um confronto com Meavora, a Awaceb também tirou um tempo para desenvolver histórias pessoais e secundárias, como a relação de Tchia e Louise, que conhecemos logo no começo do jogo, a relação entre dois vilarejos em que as pessoas não se dão bem, etc.

O jogo é uma boa pedida para quem gosta de histórias e gosta de conhecer culturas que até então foram pouco, ou nada, explorados em mídias de arte e entretenimento. Jogar Tchia foi uma experiência de conhecimento, primeiramente.

Eu particularmente gosto desse tipo de experiência de conhecer jogos onde seus desenvolvedores contam histórias intimistas ou apresentam suas vivências, coisas que eu sequer fazia ideia que existiam.

Eu nunca tinha ouvido falar da Nova Caledônia, apesar de ter um certo interesse em alguns países e povoados do Pacífico. Um jogo inspirado por uma localidade que eu nunca tinha ouvido falar foi o que mais despertou minha curiosidade com o jogo.

Me senti satisfeito de conhecer a cultura da Nova Caledônia, onde as pessoas compartilham afeto por meio do costume de presentear os coutumes, festejando e compartilhando alimentos, fortalecendo seus laços familiares e de amizade, etc.

O jogo tem uma história simples, mas bonita. Por não ter tanta complexidade ela também pode ser apreciada por novatos em videogames e até por crianças. O jogo tem classificação indicativa de 10 anos, por conta de algumas raras cenas com um pouco de violência, que podem inclusive serem desativadas no menu do jogo, deixando a experiência ainda mais amigável.

Se você gosta de conhecer novas culturas de forma educativa, mas lúdica, vale bastante a pena conhecer Tchia.

Uma agradável experiência visual e sonora

O ponto que mais chama atenção em Tchia são sua direção de arte e sua trilha sonora. A Awaceb fez um trabalho muito caprichado para representar a Nova Caledônia para os jogadores.

Todo o jogo é muito vibrante em suas cores, se inspirando bastante em filmes animados. O jogo não foca em fidelidade realista, o que favorece esse tipo de direção de arte. As partes aquáticas particularmente são lindas, o que torna a navegação e os mergulhos bastante agradáveis.

É bastante visível o amor dos desenvolvedores pelo arquipélago no empenho que tiveram ao deixar tudo bastante bonito e colorido. Além disso, a arte do jogo traz também inspirações da região, seja na sua fauna, na sua flora e também nas vestimentas dos personagens, construções típicas, etc.

Além da parte visual a trilha sonora é outro destaque. Também inspirada nas músicas da Nova Caledônia, o jogo conta com músicas executas por artistas locais, destacando e valorizando mais ainda as pessoas da região.

É possível encontrar músicas com instrumentos típicos como ukulele, percussão, etc. E as canções também são cantadas nos idiomas falados na Nova Caledônia, como o francês e o drehu.

O tema principal dá o tom logo no início do jogo, sendo uma das trilhas sonoras que mais gostei no ano, até o momento. E ao decorrer do jogo as outras trilhas sonoras não decepcionam nem um pouco.

Artisticamente falando Tchia se sobressai muito. É um jogo charmoso e carismático, que representa de forma muito bonita o arquipélago.

Uma carta de amor à Nova Caledônia

A Awaceb buscou apresentar ao mundo as origens de seus desenvolvedores e é possível dizer que fizeram isso com muito sucesso.

Tchia é um jogo para quem quer uma experiência mais descompromissada, sem muitas pressões de objetivos e conquistas. O jogo até conta com muitos colecionáveis, mas são totalmente opcionais.

É uma experiência bastante afetuosa e relaxante, que puxa um pouco nosso freio em momentos tão acelerados e caóticos que estamos vivendo nos últimos tempos.

Nome do jogo:

Tchia

Publisher:

Awaceb, Kepler Interactive

Desenvolvedora:

Awaceb

Plataformas Disponívies:

PC, Playstation 4, Playstation 5

Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge