Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge
Você piscou e mais um jogo da Nihon Falcom chega ao ocidente. Em sua missão de alcançar os lançamentos japoneses, a NIS America nos traz The Legend of Heroes: Trails through Daybreak II, o segundo jogo do arco de Calvard e décimo segundo título da franquia Trails.
Trails through Daybreak II se inicia alguns meses após o primeiro jogo. A máfia Almata foi derrotada, mas as consequências de seus atos ainda persistem, em meio a isso, uma série de assassinatos estão ocorrendo, e por trás disso está um Grendel de cor vermelha, o que faz as autoridades voltarem seus olhos para Van Arkride.
Para falarmos de Daybreak II temos que voltar um pouco no tempo, para o ano de 2021. Trails through Daybreak acabara de ser lançado, e 2022 rumava para ser o ano do próximo jogo da série Ys, afinal a franquia comemoraria seus 35 anos e a Falcom já vinha dando pequenos detalhes sobre o vindouro jogo. Até que em dezembro daquele ano, durante a tradicional reunião de investidores da empresa, Daybreak II foi anunciado, pegando muita gente de surpresa. Ainda que tivessem algumas pontas soltas, o primeiro Daybreak tinha terminado relativamente fechado, sem que uma sequência fosse urgentemente requisitada.
Os meses se passaram, o marketing foi sendo feito, incluindo um trailer de história maravilhoso (e cheio de spoilers), que eu considero o melhor trailer que a Falcom já fez, batendo até mesmo o de Azure.
Então o jogo foi lançado no Japão, e dividiu muitas opiniões e muitas inverdades foram proferidas, como normalmente acontece sempre no lançamento japonês de Trails, ao longo desses quase dois anos e meio. Daybreak II recebeu a alcunha de jogo filler e pulável por parte da comunidade, por não avançar a história principal do arco. O que é algo ultrajante devido a quantidade de coisas que esse jogo não apenas oferece, mas como prepara para o próximo título da franquia, Kai no Kiseki.
Ao longo do tempo a verdade foi surgindo, Ys X de fato era o jogo planejado para ser lançado em 2022 mas devido a problemas e atrasos durante o desenvolvimento, ele teve que ser adiado. A Falcom não pode se dar o luxo de não ter um jogo inteiramente novo por ano, afinal tem que responder aos investidores, então a empresa pegou toda a base de Daybreak, adicionou novos lugares e conceitos não prontos e tachou de minigames e atividades e então temos Daybreak II. Obrigado capitalismo!
Agora falando sério, Daybreak II é um bom jogo, de verdade. Eu gosto bastante de vários momentos dele e mesmo tendo muitas coisas pareçam confusas e mal executadas, ele ainda consegue acertar em diversos aspectos.
Não dá para negar que ele de fato dá a sensação de ser mais uma expansão do primeiro jogo do que propriamente uma sequência. Uma comparação que me vem à mente é a de que esse jogo é basicamente patches pós expansão de Final Fantasy XIV, que servem para finalizar algumas coisas e ser uma ponte para o futuro, mas em uma escala consideravelmente menor.
A Falcom claramente não tinha muita coisa pronta em termos de conteúdo, os seus olhos estavam voltados para o desenvolvimento de Ys X, já que é uma equipe bem pequena, então é bem nítido que muita coisa no jogo saiu do forno antes da hora. O próprio presidente da companhia admitiu em entrevista ao site Anime Herald que cada uma das pessoas da equipe de escritores contribuiu para algo na história sem ter uma figura para liderar o projeto, o que faz com que partes dos acontecimentos, especialmente no Ato 3 do jogo, pareçam desconjuntadas.
O maior prejudicado nisso tudo é o protagonista Van Arkride, sem que a história avance, fica impossível trabalhar muito bem com ele, então fica estagnado durante o jogo inteiro. Ele ainda é um excelente personagem e tem ótimos momentos, mas o jogo não o explora muito bem. Não atoa a primeira metade do jogo se utiliza de um sistema de rotas, onde Van não está presente em metade dela.
Não que não fosse óbvio anteriormente, mas esse jogo confirma de vez que Daybreak não é uma boa porta de entrada para a série. No primeiro jogo essa afirmação já caia por terra no capítulo 3, em Daybreak II não dá nem 2 minutos de jogo que ele já joga na tua cara que você precisa conhecer a série por completo, especialmente Sky the 3rd e Reverie.
Daybreak II possui uma gimmick, que em sua concepção é muito boa e encaixa completamente no arco de Calvard, mas o seu uso é bem exagerado e alguns momentos acabam se tornando risíveis de tão ridículos. Não quero entrar em muitos detalhes quanto a isso pois seria spoilers, mas o prólogo o apresenta.
Ainda nesse assunto, eu queria entender porque a NIS America spoilou essa gimmick sempre que foi possível nos eventos de prévia do jogo. A gente reclama sobre o quanto a Falcom não se importa em esconder spoilers, mas nem isso foi comentado pela empresa durante a divulgação do lançamento japonês.
Isso posto, não é um desastre por completo, pois, como eu disse anteriormente, o jogo acerta em muitos aspectos. O capítulo Fragments é provavelmente um dos melhores momento de toda a franquia, por exemplo.
Uma das coisas que eu mais reclamei sobre Daybreak é que a fórmula dos jogos já está um pouco saturada e repetitiva e se tem uma coisa que Daybreak II faz melhor que o primeiro é a maneira como ele é estruturado. Digo isso não somente para o sistema de rotas, que vem de Trails into Reverie, mas como também a forma em que o TEMIDO (nem tanto assim) Ato 3 é dividido. Por mais que o ritmo falhe em alguns momentos, essa divisão deixa o jogo mais dinâmico e até mesmo as rondas de NPCs são mantidas e salvas durante as rotas, mudando apenas os itens vendidos nos shops.
No “road” may exist this world from the first.
If many people walk, that place would become a “road”.
É com esse engrish contido em uma das imagens promocionais de Trails in the Sky em 2004 que a Falcom praticamente estabeleceu uma das fortes raízes da série: o mundo e seus habitantes.
Eu amo os membros da ASO e os coadjuvantes desse arco e não apenas esses personagens mais destacáveis que são trabalhados, mas os NPCs do jogo são insanamente bem escritos, além da enorme quantidade de foreshadowing e desenvolvimento de Edith e seus habitantes. O Ato 3 e o capítulo final do jogo se destacam bastante nesse aspecto e ver gente que sequer toca nesses personagens me deixa bem triste.
Enquanto a história principal não dá um passo adiante, o mesmo não se pode falar dos conteúdos opcionais como sidequests e Connect Events, que são de longe os pontos mais fortes do jogo em questão de escrita, especialmente os eventos que mostram como esses personagens são reais e bem trabalhados, com exceção de um dos eventos que sinceramente é bem creepy e preocupante em certo ponto.
Eu realmente não me importo se você vai ou não gostar de Trails through Daybreak II, mas chamar o jogo de filler e pulável deve ser uma das maiores imbecilidades já proferidas nessa, pequena porém já muito irritante, comunidade.
Outra grande adição do jogo é o Marchen Garten, que é uma espécie de Reverie Corridor de Trails into Reverie, mas que não oferece um hub ou daydreams, sendo apenas um playground para os personagens do jogo. A sua inclusão na história é forçada e sem conexão alguma com o plot principal, mas é obrigatório fazê-lo por causa do post-game, que oferece um teaser para o próximo jogo. O Garten é mais simples e mais rápido que o corredor, até mesmo oferecendo objetivos para que possamos avançar de andar. Os objetivos vão de mate x inimigos de x tamanho, quebre x objetos, coisas do tipo.
A verdade é que tanto o Marchen Garten quanto os diversos minigames incluídos nesse jogo foram uma maneira de estender a duração do mesmo por conta de sua história principal ser relativamente menor que os de Trails mais recentes. Eu terminei esse jogo na dificuldade mais alta, fazendo tudo e falando com todo mundo, com cerca de 75 horas, sendo que no jogo anterior eu gastei 120 horas, mais ou menos.
O combate do jogo também recebeu melhorias e balanceamentos. O primeiro Daybreak é bem fácil, muito por conta da desenvolvedora ainda estar se acostumando com o novo sistema, então muita coisa foi mexida, especialmente como os S-Crafts funcionam. Anteriormente, enquanto você estivesse um personagem com Shard Boost, você poderia spammar s-crafts enquanto tivesse Craft Points suficientes, agora, um cooldown foi implementado, e o personagem em questão só pode utilizar uma s-craft enquanto o Shard Boost está ativado, tendo que esperar o efeito passar para poder executá-lo novamente.
Daybreak implementou o combate híbrido na série, indo de ação para turno com o apertar de um botão, no primeiro jogo isso era um tanto simples, mas agora tivemos algumas adições, como o Cross Charge, que pode ser ativado ao desviar de um ataque inimigo no momento certo e apertando o Y/Triângulo, um outro personagem vai aparecer e dar um ataque carregado.
Já no combate em turnos, a grande adição é a EX Chain que pode ser utilizada quando o inimigo está stunado e o seu personagem da vez estiver em estado de Boost e conectado com outro personagem, isso faz com que um ataque combinado seja executado dando mais dano ao inimigo.
O chefe final do jogo é de longe a melhor batalha da franquia inteira, até o momento, em termos de concepção e execução, a Falcom acertou de maneira impressionante. Estou esperando ansiosamente pelas reações do pessoal.
A parte técnica não fica atrás, Daybreak II já mostra um avanço considerável em animações e cutscenes, e isso pode ser percebido nos novos personagens e habilidades que o jogo trouxe. Quanto ao porte de PC, eu joguei o jogo no Steam Deck, como venho fazendo recentemente, e nossa senhora, é uma diferença entre dia e noite em comparação ao port chinês que joguei anteriormente. Como é bom ver o jogo não derreter sempre que a Celis utiliza seus poderes.
Dito isso, eu tive alguns problemas de performance em duas áreas do Garten e em uma sidequest, em que o jogo começou a lagar por uns 2 minutos e voltou ao normal logo depois. Outro problema que tive é que o jogo não puxou meu save de Daybreak I direto da nuvem da Steam, eu tive que baixar o primeiro jogo novamente para que funcionasse, acredito que ambos os problemas devam ser resolvidos no dia do lançamento.
Agora sobre a trilha-sonora, é complicado analisar. Nas críticas de Daybreak I e Ys X eu comento sobre o quão é nítido a falta de direção nas trilha-sonoras na Falcom moderna, mas em Daybreak II não tem muito o que fazer quando nada ali tinha sequer uma direção certa no geral. Ainda temos excelentes músicas, mas nada é muito conectado entre si.
Ainda que passe a sensação de ser mais uma expansão do que necessariamente uma sequência, The Legend of Heroes: Trails through Daybreak II ainda traz consigo alguns pontos fortes do primeiro jogo, mesmo que alguns sacrifícios tenham sido feitos para isso.
The Legend of Heroes: Trails through Daybreak II
NIS America
Nihon Falcom
PC, Playstation 5, Nintendo Switch