Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge
Inspirado nos clássicos Resident Evil e Silent Hill, The Medium chega ao Xbox Series S e X, como um thriller psicológico na Polônia. Seguindo a clássica ideia de câmera fixa em jogos de terror, seu grande diferencial são seus dois mundos renderizados ao mesmo tempo. Uma ideia enraizada tanto nas suas mecânicas quanto em sua narrativa.
The Medium é um desses jogos vendidos como “impossível nas outras gerações” e talvez isso seja verdade. Com uma ideia criada em 2012, inicialmente planejada para Xbox 360, Playstation 3 e Wii U, o jogo se passa em dois mundos ao mesmo tempo e precisou esperar até a nova geração para existir. Graças a evolução dos consoles, agora é possível renderizar seus dois mundos, o real e o dos mortos, nativamente e ao mesmo tempo.
Não é atoa que ele foi vendido com o primeiro grande exclusivo do Xbox Series, um jogo de estúdio pequeno, com uma ideia que exige bastante capacidade. Por isso, antes de começar a falar do jogo em si, um breve porém importante recado sobre como The Medium roda em um Xbox Series S.
The Medium em um Xbox Series S roda ok. Existem quedas de frame e em diversos momentos do jogo e quase sempre a textura demora a carregar. É decepcionante para a nova geração, mas até em uma demo rodando na RTX 3080 ele tem uns problemas de desempenho. Um possível problema de otimização.
Aqui no Game Lodge não tivemos oportunidade de testar no Series X, mas em certos momentos, principalmente quando os dois mundos estão sendo renderizados, o frame de The Medium cai no Series S. Em boa parte é ignorável e passa rápido, mas em outras chega a ser um pouco frustrante.
Nenhuma informação sobre patch foi enviada para nós, então é possível que The Medium rode melhor no Series S após alguma atualização não anunciada. De qualquer forma, a ideia de renderizar dois mundos ao mesmo tempo cobra do console, e mesmo que seja a ideia principal, é o maior problema no desempenho técnico do jogo.
A ideia de dois mundos renderizados ao mesmo tempo parece um exagero e uma ideia que não é lá tão impressionante. Ainda assim, quanto mais se joga,mais se percebe que ela não está ali apenas como uma demonstração do que se pode fazer, mas sim como uma genuína e bem explorada ideia de game design.
Como esperado, a ideia dos dois mundos, além de estar inteiramente ligada à narrativa do jogo e do estilo do estúdio, serve como motivo de criação dos puzzles e das mecânicas, e é a parte mais interessante. Mesmo com a base de usar dois mundos, todas as vezes são diferentes. Tanto como vemos o jogo, que se divide em mudanças completas de mundo quanto em uma tela dividida demonstrando os dois lados, quanto o que temos que fazer em The Medium.
Existem ideias mecânicas que são utilizadas apenas uma vez e nunca mais. Dessa maneira, em momento algum o jogo se torna repetitivo ou cansativo. Claro que no meio disso existem elementos comuns de exploração, mas sempre com algo diferente. Ao mesmo tempo, da mesma forma que The Medium se divide em dois mundos conectados, os quebra cabeças se conectam a narrativa.
Em The Medium, o jogador controla Marianne, uma médium que após a morte de seu pai adotivo recebe uma ligação de um desconhecido. O homem em um certo tom de desespero pede para que ela vá a um abandonado resort da Polônia com a promessa de que irá revelar o que ela sempre quis saber.
Uma questão interessante é que não é apenas um resort, é um local construído pela União Soviética no período que governava o país. Em pouco tempo de jogo é revelado que houve uma misteriosa chacina no local. É ali que o jogo inteiro se passa, com o jogador, de uma maneira linear explorando o local e aos poucos descobrindo o passado dos seus moradores e o que aconteceu com eles e com a região.
É nessa que o jogo da Bloober Team pincela o que quer falar. Uma visão dos poloneses sobre o período da união soviética, como o povo foi tratado e como era naquela época. Aqui eu me isento de qualquer debate desse tipo por falta de conhecimento histórico, mas ainda é interessante ser apresentado a uma clara visão dos roteiristas do jogo. Em momento nenhum ele se esconde politicamente ou idealisticamente.
Além da trama principal, sobre Marianne descobrindo o motivo de estar ali, em uma busca por resposta de quem ela é, o jogo, mesmo que de maneira rasa, se aprofunda em outros temas, do momento histórico do país, até questões da psique humana. Claro, olhando bem, o contexto da Polônia acaba se tornando base para toda a sua narrativa, mas curiosamente, é dessa forma que o jogo se divide não apenas em mundos, mas também em história.
Enquanto ele tem toda uma história sobrenatural usando as regras nada específicas de seu mundo, por debaixo dos panos ele tá o tempo todo comentando sobre os problemas que o país passou, na visão dos autores, com o regime da União Soviética. Um ponto interessante é que dá ainda mais valor ao que está sendo dito, entretanto, tudo isso, tanto a parte sobrenatural quanto a histórica, são extremamente rasas.
O tempo todo ele parece querer comentar usando uma certa sutileza que não existe. Em um certo momento o jogador ganha uma faca para cortar peles do mundo dos mortos que impedem o jogador de atravessar. A faca é dita como feita de culpa e agonia, e a junção desses sentimentos cortando algo que bloqueia o caminho é óbvia e forçada demais.
Ao mesmo tempo, o jogo tenta entrar em algo ainda mais óbvio sobre psique humana, entrando na mente de personagens e encontrando o monstro interior das pessoas. É ai que ele explora muito mal temas como pedofilia e a “pura maldade”. Essas partes são muito a cara do estúdio e lembram bastante Observer, mas não combinam com The Medium e são genuinamente fracas.
É curioso, pois, não chega a ser mal escrito, mas são ideias simples demais sendo postas como grandes pensamentos que não existem na história. Isso talvez pudesse ser equilibrado com bons personagens, mas mesmo que alguns consigam conquistar o carinho do jogador, todos são pouco explorados e rasos.
A própria Marianne, o tempo todo é só sobre como ela é atormentada porém boa. Eu terminei o jogo sem saber absolutamente nada do personagem além dos pontos importantes de sua vida. Até mesmo existem falas humoradas dela, mas são tão jogadas que não se encaixam. É como se realmente tivessem pensado no que queriam fazer, mas não no como.
Poucos personagens são realmente representados e nenhum minimamente aprofundado. Todos parecem arquétipos básicos e construídos especificamente para aquele momento do jogo sem resquício de vida. Desde a protagonista até os que um dia estiveram naquele local. Se equivalente da ideia e nome do jogo, a narrativa é extremamente mediana.
Não que o mediano seja ruim,só não é incrível. Até mesmo os puzzles e mecânicas do jogo, mesmo que sempre se renovando, nem sempre são ótimas,mas na maior parte funcionam muito bem. Do começo ao fim, o jeito que ela é escrita e desenvolvida, junto de como o jogo funciona e o dos mistérios que ele salpica e resolve de uma maneira ponderada me prenderam.
Eu terminei o jogo praticamente de uma vez, pois genuinamente queria mais e curtia cada momento. Talvez o timing seja a parte mais bem desenvolvida nele. Até mesmo os momentos tensos se escondendo de monstros, dos quais normalmente não gosto, funcionam aqui pois é feito no tempo exato. Nunca demoram o tempo suficiente para cansar, nem são rápidos demais para não serem importantes.
Graças a essa noção do tempo que cada momento precisa durar, cada momento se torna melhor de ser apreciado. Mesmo que nada seja ótimo, é tudo bem construído e feito de maneira inteligente. Com esse timing, puzzles fracos não incomodam, e os bons dão o gostinho de quero mais, um elemento excelente para manter o engajamento em sua história e jogabilidade.
O novo exclusivo do Xbox Series é um bom jogo. Ele pode não se tornar inesquecível nem virar o favorito de muita gente e tudo bem. Estamos falando de um jogo de estúdio pequeno que especificamente em The Medium, experimentou bastante e criou um bom produto. Seus puzzles não são inovadores mesmo usando uma mecânica nova, sua história não é excelente, mas funciona.
A mesma coisa na música, que talvez decepcione muita gente. Mesmo tendo desde seu anúncio, vendido o fato de que Akira Yamaoka, compositor de Silent Hill estava trabalhando no jogo, ela é mediana. Como a história e boa parte da campanha, ela só funciona. São músicas genéricas de jogo de terror sem nada marcante.
No fim, ele parece um jogo criado por pessoas excelentes mas que não estavam com a melhor ideia possível. Tudo funciona e se encaixa muito bem, mas sempre parecem estar tentando ou quase conseguindo ser algo mais. Dessa forma, ele não permite brincar com o nome, chamar The Medium, de mediano, não seria certo, muito menos decepcionante. Ele é um bom jogo, que poderia ser melhor, mas não é.
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