Persona 5 – Power Fantasy e Heroísmo Moderno

Por Silvio Diaz

Em um momento em que o fascismo, nazismo e extrema direita tem ganho cada vez mais força, a população, o pobre e a minoria se encontra cada vez mais atacados. Com os poderosos ficando mais fortes, e aqueles que deviam proteger as vontades da maioria se voltando a uma mísera porcentagem de valores financeiros, é difícil não se sentir injustiçado, revoltado e pronto, da maneira que for, de lutar. Ao mesmo tempo, com o mundo tão mudado, parece que cada vez mais, “achar uma justiça” se torna algo impensável, pois no fim, estamos praticamente adestrados e mascarados para acreditar que estamos perdidos. 

Esse turbilhão de sentimentos não é novo para a humanidade, nem mesmo o inimigo, a extrema direita, é, mas o cenário mudou. Um mundo com internet e pessoas mais ricas do que nunca que podem controlar tudo sem sair de casa, criou monstruosidades que um Capitão América não conseguiria socar como fez com Hitler em seu quadrinho. Nós não acreditamos mais que essa simples violência é suficiente para derrotar toda a barbaridade sútil que vivemos e é por isso que eu quero falar do RPG da Atlus, Persona 5. Um jogo que conseguiu criar uma nova forma de heroísmo, uma “power fantasy” que cabe ao nosso mundo atual. Sem músculos, apenas com vontade e a satisfação, que nós, população mergulhada em injustiça, tanto desejámos. 

Para quem não sabe, Persona 5 é um RPG Japonês sobre adolescentes com poderes de entrar em mundos criados pela mente doentia das pessoas, mergulhadas em seus desejos, egoísmo e corrupção. Os protagonistas do jogo entram na percepção cognitiva dos vilões e os derrotam com ataques “físicos” na mecânica, mas narrativamente, vencem sua “vilanice” com o psicológico, alterando seus corações e os fazendo se arrepender, e mais importante, mudar e confessar cada um de seus crimes. 

É dessa forma que eles derrotam empresários capitalistas que tornam a vida de todos os seus funcionários um inferno ou professores pedófilos. Uma vitória que vai além da compreensão material. Satisfatória para todos os que sofreram na mão de pessoas como essas do jogo, pois no fim, além de ver arrependimento, o jogo deixa claro que eles agora pagam de maneira justa o que fizeram. Sem olho por olho, dente por dente, apenas com a nossa tão conhecida e saudosa justiça. 

Então para e pensa um pouco, seria satisfatório ver políticos criminosos, ligados por milícia apanhando? Com certeza. É certo bater em fascista, nazista e racista? Mas é claro. Isso muda o mundo agora?  Talvez 

Talvez a pandemia tenha tornado isso ainda mais difícil de acreditar, mas o sentimento cada vez maior é de que, se existe uma certeza, é que tudo vai piorar. Que os corruptos e poderosos vão continuar no lugar que estão, e que nós, população, pobre e minoria estamos condenados a viver abaixo e lutando por migalhas e é por isso que é tão importante falar sobre essa “power fantasy” que Persona 5 cria. 

O imaginário não precisa de pessoas mascaradas batendo em bandido na rua,temos isso a dezenas de anos e na década de 80, Alan Moore falou como isso era preocupante em Watchmen e até mesmo em V de Vingança. “O poder da máscara” que com habilidade e anonimidade pode transformar qualquer um em fascista. Algo que bate diretamente com os temas do jogo da Atlus.

Persona 5 - Capitalismo

Os Phantom Thieves, grupo dos personagens principais do jogo, usam máscaras quando entram nesse mundo mental, entretanto, para usar suas personas, seres poderosos que representam suas personalidades, precisam retirar as máscaras. É algo óbvio jogando, mas ainda sim, cheio de significado. Para cada um dos participantes do grupo, o primeiro momento de tirar essas máscaras que usam, para ignorar e suportar os problemas da sociedade, existe dor. Eles sangram, sofrem e têm dificuldade real no momento de tirar a máscara, mas é quando revelam sua rebeldia e desejo por mudança, é nesse momento que desistem de serem conhecidos anônimos no mundo, e passam a lutar por algo. 

Praticamente o inverso de tudo o que tivemos no mainstream de heróis, ao mesmo tempo que é exatamente o que tínhamos, uma fantasia. No caso do jogo, a ideia de ser alguém que realmente pode fazer a diferença no mundo atual. Tal qual tantos heróis davam esperança aos americanos na Segunda Guerra, ou Peter Parker ensinava que dá pra ser bom mesmo quando é difícil, Persona 5 nos dá essa esperança, de que Bolsonaros, Trumps e Jeff Bezos da vida, pessoas “fisicamente inatingíveis”, podem ser derrubados. 

Dá para passar despercebido de tudo isso jogando, mas basta prestar atenção nos vilões. São sempre pessoas com algum nível de poder sobre os outros, se aproveitando de injustiça. No fim, para alguns jogadores isso pode parecer loucura, ou esquerdismo e ficarem irritados, mas os Phantom Thieves estão lutando contra o autoritarismo e até mesmo o capitalismo, ou pelo menos, o mal que ele causa.

Persona 5 - Dinheiro

É diferente de um Homem Aranha que sai por aí prendendo em vilões e bandidos quando a raiz da criminalidade está intacta. Em narrativa isso podia funcionar antigamente, quando o mundo era mais simples, mas a coisa mudou. Hoje sabemos o nome dos políticos e ainda mais os seus ideais e quem defendem. Temos informação o suficiente para saber de nossa desigualdade econômica, do racismo, machismo e homofobia sistemáticos que atrapalham e terminam com vidas apenas para manter quem está no topo, lá. Dessa forma, prender com teias um cara que roubou um celular não serve mais. Não como se estivemos sedento por mais, o problema é que agora Norman Osborn não precisa ser um vilão mascarado para causar problema, nós temos seu nome, sabemos de seus erros e nada acontece e ele nem tenta mais esconder. 

Por isso Persona 5 é tão importante atualmente. Ele fala de algo atual como quase nada fala, ele aponta o dedo na ferida e  toca de uma maneira gentil. Sua história pode ser vista como algo brega, toda a situação do jovem se rebelar contra a injustiça do mundo pode não funcionar sempre e até mesmo em sua campanha tem deslizes, mas a ideia e o como tudo é executado é perfeito, e mais importante, é o que precisamos. 

Persona 5 é sobre esse heroísmo que tanto temos necessidade e não sabíamos, é o tipo de história fantasiosa que acolhe a sociedade a tanto tempo, mágica, porém, pé no chão o suficiente para dar fé em algo. Permitindo quem é tocado por ela acreditar, ou sonhar, de que podemos sim fazer a diferença, que o importante é retirarmos nossas máscaras quando precisamos nos rebelar ou nos arrependermos quando estamos do lado errado, pois às vezes temos uma visão cognitiva errada e podemos mudar.