Void Stranger é muito mais do que você imagina

Escrito por Jean Kei
Crítica

Void Stranger é, em sua apresentação inicial, um jogo de puzzle no estilo Sokoban, estilo de jogo de quebra cabeça que envolve empurrar objetos numa área para determinados pontos. O jogo foi feito pela System Erasure, uma equipe indie composta por apenas duas pessoas.

E quando disse que o estilo Sokoban é apenas sua apresentação inicial, é porque este jogo tem muitas camadas de profundidade. Mais do que um Puzzle a lá Sokoban, Void Stranger é um jogo sobre mistério que por vezes é sobre desespero e horror cósmico, mas as vezes também sobre amor.

E como esse jogo funciona?

Ao começar o jogo, você controla Gray, uma moça que explora um local chamado “vazio” em busca de algo. Em pouco tempo de exploração Gray encontra um cetro mágico capaz de absorver plataformas e muda-las de lugar. E é justamente a dinâmica de mexer nas plataformas que se da a forma principal de percorrer pelo Vazio.

Aqui é onde o Sokoban, que é a parte principal do jogo, entra. Você vai mexer plataformas, decorar movimento de monstros e empurrar pedras para ativar botões ao longo do jogo… A princípio nada muito novo para o gênero, mas com puzzles muito bem elaborados e alguns com soluções bem inteligentes.

Void Stranger é mecanicamente redondo

O  jogo é difícil, as vezes muito frustrante e ele sabe disso. O jogo contém um sistema de vidas limitadas, aonde você pode ganhar mais fazendo um “desafio extra” para pegar baús. Caso você perca todas suas vidas e tome um game over, você poderá continuar o jogo, mas “pagará um preço” e é ai onde um dos elementos de mistério do jogo começa a entrar.

Dificilmente você terminará o jogo de primeira sem tomar um game over, mas quanto mais você joga, mais percebe que tem mais coisas além dos puzzles óbvios.  O jogo clicou comigo no momento que percebi que ele era menos linear do que imaginava, que haviam maneiras diferentes de percorrer os andares do “Vazio” e segredos que podem facilitar o jogo.

Além disso, durante sua exploração você encontrará outras pessoas e criaturas não hostis, que podem interagir com você de maneiras diferentes.

Algumas terão diálogos engraçadinhos, algumas serão agressivas. Algumas vezes você pode ser o hostil e atacá-las, se lhe for conveniente.

Achei alguns diálogos com NPCs que encontrei ao longo do jogo legitimamente interessantes e sempre eram uma boa quebra para os vários puzzles que fazia.

Eu sou muito ruim com esse tipo de jogo, mas quebrando minha cabeça e explorando as áreas e possibilidades, consegui avançar até fazer todos os finais do jogo. Sim, ele tem múltiplos finais.

Ainda falta segredos mais complexos para descobrir, mas terminei todos os finais do jogo e descobri diversos segredos (e tem muitos) num total de 70 horas, deixei algumas coisas passar pela primeira vez, também entendia uma dica de maneira errada. Provavelmente alguém que esteja mais acostumado com o gênero e tenha olho mais atento, termine o jogo em muito menos tempo.

 

Uma das graças do jogo é entender quem são os personagens

O jogo é dividido por diversas sessões, e ao fim de cada uma delas lhe é permitido descansar. Como o jogo sabe que é pesado, ele fechará na sua cara para você ficar um tempinho longe dele esfriando a cabeça.

Ao voltar ao jogo, você não volta de imediato, mas sim dentro de um sonho da Gray, descobrindo mais sobre o passado dela, no qual ela era uma pessoa de confiança de uma princesa. Ao longo do jogo você vai entendendo a relação de Gray com essa princesa e com o mundo, e eventualmente as razões pela qual ela entrou neste Vazio

O que verdadeiramente encanta, é que esses sonhos não são apenas flashbacks narrativos, mas uma oportunidade de brincar um pouco com suas expectativas de gameplay.

Logo no primeiro sonho o jogo se torna um RPG por turno, por exemplo. Há outras brincadeiras com gêneros diferentes em outros sonhos, me dando a sensação de nunca saber o que esperar do jogo.

 

Void Stranger tem uma narrativa surpreendentemente forte

Um dos pontos que mais me encantou no jogo foi sua narrativa e forma não linear de contá-la. O jogo usa as mecânicas de puzzle e a sua dificuldade de forma coesa com sua narrativa. Tanto que a dificuldade do jogo não é linear, mas sim em função da narrativa em ser mais ou menos difícil.

Quanto mais eu fui descobrindo sobre Gray, suas motivações e sobre outros personagens, mais eu ficava investido no jogo. E ele me tocou tanto especificamente por ser um videogame. 

A forma com que Void Stranger usa a linguagem de videogames para contar sua história é muito eficaz e instigante.

O ponto mais forte é o quão o jogo consegue transitar entre suas temáticas sem parecer forçado ou desconexo. As vezes temos piadas escrachadas seguido de momentos genuinamente emocionantes sem um atropelar o outro.

A arte e trilha de Void Stranger são outros pontos altos.

Gosto muito da direção de arte desse jogo. Ele emula a estética de Game Boy, sendo um jogo preto e branco, mas podendo escolher paletas de cores diferentes. Com o pouco uso de cores, o jogo consegue definir bem sua atmosfera, apostando em desenhos muito bem feitos e uma trilha que, para um jogo que é difícil e vai te fazer ficar muito tempo num mesmo lugar ouvindo as mesmas coisas, não enjoa.

O jogo tem músicas mais calmas e contemplativas, mais opressoras e até, as vezes, um tanto animada.

A trilha sonora dita muito bem o tipo de puzzle que você está fazendo na área, tendo musicas mais animadas em lugares com muitos monstros, musicas mais calmas em puzzles que exigem analise mais calma, e músicas opressoras em puzzles difíceis em cenários mais opressores.

Segredos e mais segredos

Esse jogo tem MUITO conteúdo e muito segredo.

Há maneiras inesperadas de usar mecânicas do jogo, segredos metalinguísticos que envolvem quebrar o jogo de maneira inesperada, múltiplos finais e muita, muita coisa.

Não apenas segredos que te entregam itens e recursos que facilitam sua exploração dentro do jogo, mas segredos que falam sobre a história do mundo do jogo, que é muito densa e possuí diversos elementos.

só prestando atenção em detalhes e em diálogos você consegue pegar bastante coisas, mas há muitos enigmas que me fizeram tirar print, discutir com um amigo que também recebeu o jogo e ficar pensando no jogo por dias a fio..

Se eu dizer que não fiquei fascinado com o jogo durante semanas, estaria mentindo.

O processo de jogar Void Stranger como um jogo linear, perceber que ele tem segredos, começar a explorar o jogo de forma não linear e descobrir mais sobre ele foi fascinante.

Mas, eu sei que esse jogo não é para todos

Void Stranger é um jogo intrigante, difícil, as vezes muito pesado e frustrante. A proposta principal dele exige um certo investimento. Teve vários momentos que empaquei e quase desisti do jogo, mas os vários pontos positivos listados me faziam sempre continuar. Void Stranger me frustrou, me encantou, me assustou e me fez rir.

É um jogo com uma apresentação simples mas tão bem amarrado e polido, e com tantas camadas além da superfície inicial que me fez continuar onde em outros jogos provavelmente desistiria.

É perfeitamente compreensível que Void Stranger não seja pra você, mas para mim, é um dos melhores jogos do ano num ano excelente para jogos.

Nome do jogo:

Void Stranger

Publisher:

System Erasure

Desenvolvedora:

System Erasure

Plataformas Disponívies:

PC

Nota: 10

Esta crítica foi escrita usando uma key enviada para o Game Lodge